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24/11/2017

JOÃO 2:20


Respondeu-lhes Jesus: Derrubai este templo, e em três dias o levantarei. Disseram-lhe então os judeus: Em quarenta e seis anos foi edificado este templo, e tu o levantarás em três dias? (Jo 2:19-20)

Estes 46 anos podem ajudar-nos com a cronologia da vida de Jesus?

O templo e o santuário

Observamos que nesta mesma passagem da purificação do templo (Jo 2:13-22), o Grego tem duas palavras diferentes traduzidas ‘templo’.

No v. 14 - No templo, Jesus encontrou os vendedores de bois, de ovelhas … - e no v. 15 - Tendo feito um chicote, expulsou todos do templo … a palavra grega é íeron (hieron).

Nos vs. 19, 20 e 21 é usada a palavra naoς (naos). Algumas versões (ex. Bíblia de Jerusalém) traduzem esta palavra como ‘santuário’.

‘Hieron’ refere-se ao inteiro recinto do templo, incluindo os átrios, os pórticos e todas as dependências, ou seja, o espaço público onde todos os israelitas podiam entrar.

O ‘naos’ é o santuário interior: o lugar santo, onde apenas os sacerdotes podiam entrar, e o santo dos santos, apenas o sumo-sacerdote uma vez no ano.

Esta diferença é clara em João que utiliza sempre ‘hieron’ (Jo 5:14; 7:28; 8:20; 18:20) e ‘naos’ apenas nesta passagem de 2:19-21. A mesma diferenciação encontramos por ex. em Mc 11:11 (hieron) e 15:38 (naos).

Segundo Josefo, Herodes empreendeu a muito grande tarefa de (re)construir o templo no 18º ano do seu reinado (Ant. 15.380). Mas numa parte do templo, nem o rei podia entrar, e Herodes não entrou no santuário porque ele não era sacerdote. Ele tratou da obra dos átrios e espaços exteriores (periboloς é o termo usado por Josefo em Guerras 1.401); e estes construiu em oito anos (Antiguidades 15.420). O santuário interior (naoς) foi construído pelos próprios sacerdotes e isto em um ano e seis meses (Ant. 15.421). Quando o ‘naos’ foi acabado de construir houve grande alegria e celebrou-se uma festa.

Portanto, deduzimos que os 46 anos indicados pelos judeus em Jo 2:20 têm referência à construção do “naos” (santuário interior) pelos sacerdotes e não do templo (hieron) na sua totalidade por Herodes.

Ainda tem a questão do verbo oikodomhjnh (Jo 2:20), que é um aorista indicativo passivo, significando literalmente “foi construído” e compreende-se melhor como já estando erguido há 46 anos, não se referindo à duração do ato de construir (Finegan § 595).

Josefo diz que a festa de celebração da obra do “naos” coincidiu com o dia da inauguração do rei (Ant. 15.423). Uma fonte extra bíblica, o Tratado Rosh Hashanah no Mishna, elucida que o Ano Novo para reis é 1 de Nisan (Finegan § 164).

Este diálogo sobre o ‘naos’ tem lugar na primeira páscoa do ministério de Jesus. A páscoa celebra-se em 14 de Nisan.

Assim, na primeira Páscoa (no mês de Nisan) do ministério de Jesus tinham passado 46 anos desde que se celebrou a edificação do “naos” do templo.
Agora trata-se de descobrir qual o ano.

Cronologia do reinado de Herodes segundo Josefo

Herodes foi nomeado rei pelos Romanos, quando Calvino e Pollione eram cônsules (Ant. 14.389). Isto é o ano 40 a.C.. Era costume em Roma designar o ano pela menção dos dois cônsules em exercício nesse ano. Os cônsules eram eleitos por um ano. Bastava a referência aos dois cônsules para determinar o ano (Finegan § 172).

Depois de um cerco de vários meses, Herodes conquista Jerusalém pela força, em outubro, no dia da Expiação (Tishri 10). O cerco começara no início desse mesmo ano – no terceiro ano desde que fora feito rei em Roma –, depois de passado o rigor do inverno (Ant. 14.465), e continuou durante o verão (Ant. 14.473).

Mas quanto ao ano em que isto aconteceu, Josefo não é coerente. Ele diz que foi no ano em que Agrippa e Gallo eram cônsules – isto seria 37 a.C. – e 27 anos depois que Pompeu conquistou Jerusalém (em 63 a.C.) – isto seria 36 a.C.

A isto acresce outra dificuldade: se o ano novo para reis é 1 de Nisan, a partir de Nisan de que ano é contado o reinado de Herodes? Nisan antes da conquista, sendo o primeiro ano um ano incompleto mas ainda assim considerado o primeiro ano? Ou a partir de Nisan depois da conquista, havendo assim um “ano de acessão” (um período de alguns meses) não contado?

Como resolver este problema?

No ano 31 a.C., em 2 de setembro, teve lugar a batalha de Actium, em que Octaviano (mais tarde conhecido como Augusto) derrota Marco António. Josefo afirma que este ano corresponde ao 7º ano de Herodes (Ant. 15.121).

Assim sendo, o 7º ano de Herodes corre de Nisan 31 a.C. a Nisan 30 a.C.

Por conseguinte, o 1º ano de Herodes começa oficialmente em Nisan de 37 a.C., a conquista de Jerusalém em outubro desse mesmo ano.

Isto também está de acordo com Ant. 14.465, onde Josefo diz que o cerco a Jerusalém começou depois do rigor do inverno, no terceiro ano desde que fora feito rei em Roma.

O 18º ano de Herodes, quando empreende a obra do templo, corresponde então a Nisan 20 a.C. a Nisan 19 a.C.

O ‘naos’ durou um ano e seis meses a construir. A festa foi celebrada em Nisan na mesma data que a da inauguração rei. Isto significa que a edificação do ‘naos’ terá sido celebrada no final do décimo-nono ano de Herodes, em Nisan de 18 a.C.

46 anos depois (Jo 2:20) leva-nos ao ano 29 d.C.,  à páscoa em que ocorre o que está descrito em João 2:13-21 e a primeira páscoa do ministério de Jesus.

Disto deduzimos que Jesus iniciou o seu ministério na páscoa de 29 d.C..

Podemos provar que isto está correto com o apoio de outros testemunhos?

O nascimento de Jesus

Nas anteriores mensagens chegámos à conclusão que Jesus nasceu em data incerta do ano 2 a.C., antes da vinda dos magos a Belém (em aprox. 25 de dezembro de 2 a.C.) e antes da morte de Herodes que ocorreu pouco depois do eclipse de 10 de janeiro 1 a.C.

Jesus foi batizado ainda ele não tinha 30 anos. Começava a ser de quase trinta anos (Lc 3:23). Tinha quase. Se nasceu em 2 a.C., tem 29 anos em 28 d.C. e completa 30 anos no ano 29 (o ano da primeira páscoa).

Jesus nasceu cerca de 5 meses depois de João Batista.

João Batista era de família sacerdotal. Começou a sua pregação no 15º ano de Tibério, entre agosto/setembro do ano 28 e agosto/setembro do ano 29, quando fez 30 anos (ver mensagem O ANO QUINZE DE TIBÉRIO, julho 2017).

Admitindo que João começou a pregar logo no início do 15º ano de Tibério (ano 28), em agosto, Jesus não podia fazer 30 anos antes de finais de janeiro/fevereiro do ano 29. Mas pode ter sido batizado por João um pouco antes, no fim do ano 28 ou princípio do ano 29, e começado o seu ministério na páscoa do ano 29 que nesse ano terá sido em 18 de abril. Este prazo dá tempo suficiente para integrar os eventos descritos por João entre o batismo e a primeira páscoa. O batismo foi imediatamente seguido pelo período de 40 dias no deserto (Mc 1:12). Depois da temporada no deserto, Jesus regressa onde João estava a batizar (Jo1:36) e este o vê passar. Dois dos discípulos de João vão atrás de Jesus e ficam com ele aquele dia (Jo1:37-42). No dia seguinte, Jesus quis ir a Galileia (Jo 1:43) e no terceiro dia, está presente nas bodas de Caná na Galileia (Jo 2:1). Depois desce a Cafarnaum (a norte do mar da Galileia) onde ficou “não muitos dias” com os primeiros discípulos antes de subir para a sua primeira páscoa em Jerusalém. Não sabemos quantos dias são “não muitos dias”, mas como João não menciona qualquer acontecimento entre Cafarnaum e a primeira páscoa, não deve ter sido um período muito longo. Pouco mais de 60 dias terão decorrido entre o batismo e a descida a Jerusalém.

Esta data de finais de janeiro/fevereiro do ano 2 a.C. para o nascimento de Jesus enquadra-se também muito bem com o recenseamento/juramento associado ao título de Pater Patriae de Augusto recebido em fevereiro de 2 a.C. (ver mensagem RECENSEAMENTO DE QUIRINO, fevereiro 2017) razão pela qual José e Maria se deslocaram a Belém.

Também Josefo faz referência a um juramento situando-o entre 12 a 15 meses antes da morte de Herodes, portanto, dentro do período em consideração: todo o povo dos judeus deu garantias da sua boa vontade para com César e o governo do rei, mas mais de 6.000 dos fariseus recusaram-se a fazer o juramento (Ant. 17.42). Tudo indica que se trata do mesmo alistamento de Lucas.

Por outro lado, esta hipótese não se enquadra com as datas astronómicas do aparecimento e progressão da “estrela de Belém” (ver mensagens A ESTRELA DE BELÉM, maio 2017). Apenas o efeito “coroa”, isto é o movimento circular visível de Júpiter por cima da estrela Régulo devido à retrogressão em 29 de novembro 3 a.C. e o retomar da sua rota normal em 29 de março 2 a.C., pode parecer uma aproximação à data de nascimento de Jesus. Mas não quero atribuir muita importância à sequência e datas dos eventos astronómicos, embora bastante extraordinários. Fora o facto de os magos terem seguido uma estrela, provavelmente o planeta Júpiter, e chegado a Belém num período em que Júpiter estava numa posição estacionária e zenital sobre Belém, o que ocorreu astronomicamente no final do ano 2 a.C., e o prazo de dois anos para baixo definido para a matança das crianças de Belém associado ao tempo do nascer da estrela (Mt 2:16), não há mais indicações bíblicas de que as datas das várias e sucessivas conjunções de planetas em 3 e 2 a.C. tenham correspondência exata com datas de concepção e nascimento de Jesus.

Na mensagem A ESTRELA DE BELÉM (3) cheguei a considerar a possibilidade de usar as datas astronómicas da progressão de Júpiter para determinar a data do nascimento de Jesus. Apresentavam-se várias alternativas: 11 de setembro de 3 a.C. (por causa de Ap 12:1), 17 de junho 2 a.C. e 25 de dezembro 2 a.C. (a interpretação tradicional). A solução melhor pareceu-me então a do nascimento em junho, quando aliada à interpretação do 6º mês da anunciação (Lc 1:26) não como o 6º mês da gravidez de Isabel mas como o 6º mês do ano. O que também anularia a necessidade de estabelecer com exatidão a semana do turno de Abias.

Agora, porém, nenhuma destas hipóteses me parece válida, quando temos em conta a referência aos 46 anos da construção do santuário.

A data de 11 de setembro (Tishri 1) 3 a.C. é defendida por alguns por analogia com Apocalipse 12:1-2. Mas em meu ver este é um versículo altamente simbólico, nem específico da figura de Maria, mas alargável a Israel e a Igreja. No limite pode-se interpretar este versículo como condensando numa só frase todo o período da gravidez, desde a concepção até ao dar à luz. Além disso, com o nascimento em 11 de setembro 3 a.C., Jesus completaria 30 anos em 28 d.C., demasiado cedo portanto, além de não se enquadrar com o 15º ano de Tibério para João Batista e existir um prazo demasiado longo entre o batismo com quase 30 anos e a primeira páscoa em 29.

Com o nascimento em junho de 2 a.C. Jesus não teria ainda 30 anos na primeira páscoa do seu ministério no ano 29. O que poderá não ser um impedimento, já que Jesus não era de família sacerdotal como João Batista e nada indica que teria obrigatoriamente que ter 30 anos. Mas Lucas 3:23 diz que Jesus começava a ser de quase trinta anos quando foi batizado e logo de seguido levado ao deserto para a tentação de 40 dias. Mas como já dissemos acima, terá havido pouco mais de 60 dias entre o batismo e a páscoa. Com estes cerca de 60 dias até à páscoa e ainda o tempo até ao mês de junho há demasiado tempo para fazer (quase) trinta anos. Portanto, esta hipótese também não se coloca. A não ser que a primeira páscoa seja no ano 30 d.C. Mas nesse caso, o tempo entre o batismo com quase 30 anos e a páscoa do ano 30 é um prazo demasiado comprido para os poucos eventos descritos em João ocorridos antes da primeira páscoa (ver também mensagem A DURAÇÃO DO MINISTÉRIO DE JESUS, setembro 2017).

Muito menos é válida a hipótese (tradicional) do nascimento em 25 de dezembro 2 a.C. Esta situaria necessariamente a primeira páscoa no ano 30.

Concluindo:
Depois de todas as mensagens ao longo do ano 2017, em que procurei estabelecer a data do nascimento de Jesus, a minha proposta é que Jesus nasceu no ano 2 a.C. em janeiro/fevereiro, por me parecer a data que melhor concilia os dados bíblicos com os extra-bíblicos, sem torcer o que diz a Bíblia para encaixar nos dados extra-bíblicos.

Bibliografia
The Works of Josephus. Translated by William Whiston. New updated edition. 1987

Jack Finegan. Handbook of biblical chronology. Revised edition 1998

11/07/2017

O DÉCIMO-QUINTO ANO DE TIBÉRIO

Segundo Lucas 3:1-2, João Batista começou o seu ministério (veio a palavra de Deus a João) no 15º ano de Tibério. Esta data ajuda-nos a determinar o ano de nascimento de Jesus.
O 15º ano de Tibério corria de 18 setembro do ano 28 a 18 setembro do ano 29 d.C.
Se esta data é inserido nas Escrituras, significa que é uma data que Deus permite que utilizemos para determinar a cronologia bíblica. Terá também sido uma data conhecida, utilizada pelos contemporâneos de Jesus e de Lucas.
Tibério começou a governar como Imperador no ano14 d.C. O antecessor de Tibério, Augusto, morreu em 19 de agosto do ano 14 d.C., com 75 anos de idade. O Senado reuniu em 17-18 de setembro do ano 14, data em que conferiram oficialmente a Tibério o título de Imperador.
Alguns defendem que o início do governo de Tibério não é o ano 14, mas o ano 12, alegando a existência de uma coregência. De facto, amplos poderes foram conferidos a Tibério nesse ano, mas não se tratava de uma coregência de modo a que o seu reino (Gr. HEGEMONIA) começasse nessa data. A razão para alguns quererem adiantar o início do reino de Tibério para 12 tem a ver com a ideia generalizada de que Herodes morreu em 4 a.C. baseado em informações tiradas de Josefo. Mas visto que Jesus nasceu quando Herodes ainda era vivo, e se a morte de Herodes fosse em 4 a.C., em 28-29 d.C. Jesus teria já muito mais de 30 anos e não quase trinta anos como afirma Lc 3:23.
Numa anterior mensagem (fevereiro 2017), já vimos que Herodes não morreu em 4, mas em 1 a.C..
Também podemos confirmar a data de 14 d.C. para o início do reino de Tibério Imperador (KAISAR), da seguinte maneira:
Conhecemos o ano da morte de Tibério. Segundo Suetónio, Tibério morreu quando tinha 78 anos de idade, e no ano 23 do seu reino, no dia 17 antes das Calendas de abril, quando Gnaeus Acerronius Proculus e Gaius Pontius Nigrinus eram cônsules. As Calendas (Lat. KALENDAE) referiam-se ao primeiro dia do mês.
Era costume em Roma designar o ano referindo-se aos dois magistrados, os cônsules, mandatados para aquele ano. O mandato de cônsul tinha a duração de um ano, começando em 1 de janeiro. A referência aos dois cônsules em exercício era suficiente para indicar o ano. As listas consulares começam em 509 a.C. e terminam em 541 d.C. quando foi abolida a prática da nomeação de cônsules. Devido a este método de datação, era importante manter registos. Muitas destas listas foram conservadas, quer na forma de inscrições monumentais, convencionalmente referidas como fasti, ou indiretamente através dos escritos de antigos historiadores que tinham acesso aos registos onde estavam inscritos os nomes dos cônsules.
A data consular da morte de Tibério corresponde, no calendário gregoriano, a 16 de março do ano 37. Portanto, 37 menos 23 leva-nos ao ano 14.
Mas há uma dificuldade adicional: De que dia contar o início do reinado de Tibério? A partir do dia em que Augusto morreu, 19 de agosto? Ou a partir do dia em que o Senado lhe conferiu o título, 18 de setembro? Ou a partir de 1 de janeiro desse ano ou do ano seguinte?
Thomas Lewin, em Fasti Sacri (1865), baseado em Tácito, Plínio o Velho, Dio Cássio e Filo, prova que não pode ser 1 de janeiro. Portanto, 19 de agosto será a data que Tibério substituiu de facto o seu predecessor, até que é nomeado e entra em exercício de jure em 18 de setembro.
Portanto, as datas do reino de Tibério são setembro de 14 d.C. a setembro 37 d.C.
Assim, usando o calendário gregoriano, o 15º ano de Tibério apanha a última parte do ano 28 (cerca de 3 meses e meio) e o ano 29 até 18 de setembro.

Jesus e João Batista
No 15º ano de Tibério, João Batista começou o seu ministério (Lc 3:1-2). Foi nesse ano que ele se mostrou a Israel (Lc 1:80). A palavra traduzida com o verbo “mostrar” é um substantivo em Grego “anadeixis” (anadeixis), que significa o ato de designar, mostrar/apresentar publicamente, designar alguém para um ofício, proclamar ou anunciar alguém eleito para um cargo. Na forma de verbo (anadeiknymi), ocorre duas vezes no NT, em At 1:24 – mostra qual destes dois tens escolhido - e Lc 10:1 – designou o Senhor outros setenta.
João, como seu pai Zacarias, era sacerdote. A idade para iniciar o ministério sacerdotal em Israel era de 30 anos. Atendendo ao significado da palavra, Lc 1:80 deve referir-se à designação de João para o ministério logo após o seu 30º aniversário.
Quando Jesus foi batizado por João, ele “começava a ser de quase trinta anos” (Lc 3:23). Algumas traduções dizem cerca de trinta anos, mas isso não está correto.
Quem diz “cerca de” demonstra que não tem o conhecimento exato. “Quase” demonstra maior rigor. É provável que Lucas sabia a idade correta de Jesus, ou pelo menos o ano em que nasceu, porque os factos lhe foram transmitidos “pelos mesmos que os presenciariam, desde o princípio, e foram ministros da palavra” (Lc 1:2). Embora ele não nos dá uma data como nós a daríamos – dia X do mês Y do ano Z –  ele narra uma série de eventos relacionados no tempo que nos permitem, com alguma paciência e investigação, e oração, reconstruir pelo menos o ano em que Jesus nasceu. Lucas não teria indicado o 15º ano de Tibério se tivesse sido o 16º ou 17º. Não faria sentido.
Sabemos que Jesus foi gerado quando Isabel estava no seu sexto mês de gravidez. Há portanto uma diferença de idade de cinco a seis meses entre os dois. João não podia ter 30 anos antes de setembro do ano 28 quando começou o 15º ano de Tibério. Por isso, Jesus só podia ter 30 ou quase 30, no mínimo 5 meses depois, e portanto, necessariamente, no ano 29 d.C..  Data apoiada também pela astronomia que revelou a chegada dos magos a Jerusalém no final do ano 2 a.C., e a morte de Herodes entre finais de janeiro/fevereiro do ano a.C.
E então já podemos ter por certo que Jesus nasceu no ano 2 a.C.

Bibliografia
Thomas Lewin, Fasti Sacri or A Key to the Chronology of the New Testament (1865)

29/06/2017

O TURNO DE ABIAS

A vida de Jesus está cronologicamente interligada com a de João Batista. Há vários momentos na vida de João que talvez possam ajudar a desvendar a cronologia da vida de Jesus, a começar pela narrativa da sua concepção e nascimento.
O sacerdote Zacarias, na ordem do seu turno, entrou no santuário, quando lhe apareceu o anjo Gabriel anunciando-lhe o nascimento de um filho (Lc 1:5-22). Terminados os dias do seu ministério, Zacarias voltou para a sua casa e, passados esses dias, Isabel, sua mulher, concebeu, e ocultou-se por cinco meses (Lc 1:23-24). Quando Isabel estava no seu sexto mês de gravidez (Lc 1:36), o mesmo anjo foi ter com Maria, anunciando o nascimento de Jesus (Lc1:26-38).
O que poderia ajudar a definir a data do nascimento de Jesus, e de João Batista, seria o conhecimento de quando é que o turno de Abias (Lc 1:5) estava de serviço no templo.
1Crónicas 1:24 relata como, no tempo de David, se organizou o serviço do santuário. Entre os filhos de Eleazar e os filhos de Itamar foram constituídos 24 turnos de sacerdotes. Os de Eleazar estavam em maior número, 16, os de Itamar eram apenas 8 turnos. A ordem dos turnos foi repartida por sortes, alternadamente, começando por Eleazar[i].
Nesta lista, o turno de Abias (que seria o turno a que pertencia Zacarias) aparece em 8º lugar.
Cada turno servia durante uma semana, entrando e saindo no sábado (2Cr 23:8).
Há várias dificuldades associadas à questão dos turnos de sacerdotes. Como se organizavam os turnos ao longo do ano, havendo 24 turnos? E quando servia o oitavo turno de Abias? Outra dificuldade são as disrupções que o sacerdócio sofreu no tempo do exílio, quando não havia templo, e noutras alturas como no tempo de Antíoco Epífanes, e como isto afetava a sequência dos turnos.
Quando os Judeus voltaram a Jerusalém depois do decreto de Ciro, apenas 4 famílias sacerdotais regressaram com Zorobabel e Jesua (Esdras 2:36-39; Ne 7:39-42): os filhos de Jedaías (2º turno), de Imer (16º turno), de Pasur e de Harim (3º turno). Pasur não aparece na lista de 1Cr 24, mas com base em 1Cr 9:12 (a lista dos sacerdotes que ficaram a viver em Jerusalém depois do regresso do exílio) deduzo que se trata dos filhos do turno de Malquias (5º turno).
Em Neemias 12:1-7 há uma lista de 22 sacerdotes que subiram com Zorobabel e Jesua. Estes 22 foram os chefes dos sacerdotes nos dias de Jesua.
E Neemias 12:12-21 há outra lista de sacerdotes, cabeças de família, agora nos dias de Joiaquim. Joiaquim era filho de Jesua, e foi sumo-sacerdote depois dele. Esta segunda lista tem apenas 20 nomes. Quando comparamos esta com a primeira, dois nomes desapareceram (Hatus e Reum); dois passaram a um só (Piltai, de Miniamim e Moadias); e foi acrescentado um (Adna, de Harim).




** Nesta lista não segui a ordem do texto de Neemias.
Em itálicos, os nomes que não correspondem nem com a lista de Ne 12:1-7, nem com a lista de Ne 12:12-21, por isso não tenho a certeza que estejam no lugar correto da lista como membro da família.

Provavelmente as 4 famílias sacerdotais que regressaram do exílio foram subdivididas, acabando por organizar-se em 24 turnos como originalmente e tomando a designação inicial destes. Josefo, cujos ancestrais pertenciam ao turno de Jeoiaribe, refere que a divisão original de 24 turnos esteve em existência até aos seus dias (Antiguidades). E uma inscrição encontrada nas ruinas de uma sinagoga em Cesareia, que data de final século III, início século IV d.C. traz quatro nomes idênticos aos da lista de 1Crónicas 24: Hezir (17º), Hapizez (18º), Petaías (19º) e Jeezquel (20º), corroborando assim Josefo (FINEGAN, #240).
Zacarias pertencia ao turno de Abias. Julga-se que este turno se refere ao 8º turno conforme a designação estabelecida em 1Cr 24 (v.10). O turno de Abias nada tem então a ver com um sacerdote de nome Abias que aparece nas listas de Neemias 12:1-7; 10:1-8 e 12:12-21.
Mais difícil e menos consensual é a organização do serviço dos 24 turnos no templo ao longo do ano, semana a semana. As Escrituras não apresentam pormenores. Apenas ficamos a saber que cada turno servia durante uma semana, entrando e saindo no sábado (2Cr 23:8).
Josefo e a Mishná, uma obra do judaísmo rabínico, também afirmam que a troca de turnos era feita no dia de Sábado, o turno que saía oferecia o sacrifício da manhã e o turno que entrava, o sacrifício da tarde. A Mishná afirma que nas três grandes festas do ano – Páscoa, Pentecostes e Tabernáculos – todos os turnos estavam de serviço (FINEGAN, #241).
Têm sido propostos vários sistemas para a organização dos turnos sacerdotais na esperança de poder calcular corretamente a data do nascimento de Jesus.
No fundo, há duas grandes correntes de opinião, com variantes:
a)         Uns defendem um ciclo regular que reinicia todos os anos, no 1º mês (isto porque Êxodo 12:2 estabelece Abibe como início dos meses do ano), ou no 7º mês (isto porque o templo de Salomão foi inaugurado no 7º mês e depois do exílio, o altar foi reconstruído no 7º mês). Dentro deste sistema, há alguns que pensam que havia uma interrupção da rotatividade por ocasião das 3 grandes festas, em que todos os turnos estariam de serviço, a rotatividade retomando normalmente depois da festa.
b)         Outros defendem um sistema de rotatividade contínua, ininterrupta, dos 24 turnos. Depois de um ciclo de 24 semanas, recomeça novo ciclo de 24 semanas, seja qual for o momento do ano.

Antes de analisarmos os problemas com estas propostas, convém saber como funciona o calendário que os Judeus utilizavam, e ainda utilizam.
O calendário hebraico é um calendário baseado em unidades de tempo diferentes entre si – o ano solar, o mês lunar, a semana de sete dias, e o dia do pôr-do-sol ao pôr-do-sol.
A unidade da semana foi estabelecida desde o princípio dos tempos pelo próprio Senhor, como podemos ler em Génesis 1. A semana da Criação, culminando no dia de descanso do Senhor, forma a base da unidade de tempo.
O ano solar – que corresponde à rotação da terra em volta do sol – é de 365 ¼ dias. Isto requer que de 4 em 4 anos o ano tem mais um dia, 366 dias (ano bissexto). Um ciclo lunar tem 29 dias, 12 horas, 44 minutos e 3 1/5 segundos (29,53059). Isto faz com que doze meses lunares perfazem apenas 354 dias, alternando entre meses de 29 e de 30 dias. Os 11 dias que faltam para o ano solar são compensados com um mês adicional intercalado a cada 2 ou 3 anos, sempre a seguir ao 12º mês de Adar, e é chamado Segundo Adar ou Ve-Adar. Isto para os meses não “viajarem” ao longo dos anos.
O que define a regularidade deste mês intercalar é um ciclo de 19 anos, designado como ciclo metónico. A designação vem do filósofo Meton de Atenas que descreveu este sistema em 433 a.C., mas o sistema já era conhecido pelos astrónomos da Babilónia no século 8 a.C.. No ano 353 d.C., Rav HILEL fez calendários usando este ciclo de 19 anos e é onde se baseia o calendário hebraico utilizado ainda hoje.
Neste ciclo de 19 anos, há 12 anos de 12 meses e 7 anos de 13 meses. O mês intercalar é sempre é inserido no 3º, 6º, 8º, 11º, 14º, 17º e 19º ano do ciclo.
Não se sabe se os sacerdotes do Velho Testamento usavam este ciclo calculado de 19 anos do mesmo modo, ou se a inserção do mês adicional se fazia de modo mais empírico.

Com este calendário, voltando à questão dos turnos sacerdotais, nem sempre o ano tem o mesmo número de semanas.
E é aqui que está a fraqueza do sistema a). É difícil fazer com que 24 turnos oficiem exatamente duas vezes por ano (24 x 2 = 48 semanas).
Quer o ciclo anual recomece no 1º ou no 7º mês, sempre com o primeiro turno de Jeoiaribe, haverá sempre alguns dos primeiros turnos que cheguem a oficiar 3 vezes no ano, principalmente nos anos em que há um mês intercalar, significando mais semanas nesse ano. E nos anos mais curtos, e considerando que a rotatividade é interrompida por causa das festas (cuja duração não é uma semana simples de sábado a sábado, mas pode começar a meio de uma semana até o meio da semana seguinte), neste caso, o 24º turno pode vir a servir apenas uma vez por ano.
Com base em Dt 18:6-8, isto seria ilegal porque todos os sacerdotes levíticos tinham igual direito aos benefícios de servir no santuário. Não seria justo um sistema que deixasse que um turno de sacerdotes servisse duas semanas por ano, outro, três, e outro apenas uma [1].
Ao contrário, o sistema b) de rotatividade contínua, ininterrupta, dos 24 turnos, garante uma distribuição justa do serviço sacerdotal e obedece assim ao estipulado em Dt18:6-8.
E parece que tem maior sustentação histórica. O Seder Olam afirma que o turno que estava de serviço quando Jerusalém foi destruída no ano 70 era o primeiro turno, o de Joiaribe. Jerusalém foi destruída no mês de Av, que é o 5º mês, em 9 de agosto de acordo com o nosso calendário. Portanto, se o 1º turno estava de serviço no 5º mês, nunca o 1º mês nem o 7º podiam ser o ponto de partida anual fixo da rotatividade dos turnos.
A única maneira de garantir uma distribuição justa do serviço sacerdotal é os 24 turnos se sucederem na sua ordem em 24 semanas seguidas e recomeçar de novo, seja em que mês do ano for. Assim não há lacunas, não há serviços “saltados” por uma semana devido aos dias de festa, e não há uma data anual para fazer um “reset”.
E tem a vantagem de, desde que se conheça qual o turno de serviço numa data conhecida, poder fazer um cálculo para trás, semana a semana até ao ano apontado para o nascimento de Jesus. Isto porque o ciclo de sete dias é um sistema rotativo contínuo e ininterrupto sem qualquer conexão com calendários lunares ou solares. O Sábado só pode ser determinado contando para trás até ao Sábado anterior.
Era o trabalho dos sacerdotes promover e manter a observância do Sábado em Israel. E a Lei exigia também a contagem dos anos sabáticos e dos jubileus, e dos dias e semanas das várias festas no ano. Os turnos sacerdotais são inextricavelmente sincronizados com o Sábado. Havendo 24 turnos, havia 24 grupos de sacerdotes que garantiam a contagem do tempo de 24 semanas até ao seu próximo serviço.
É, no entanto, possível que tenha havido uma interrupção do serviço do templo no ano 63 d.C. quando o general romano Pompeu invadiu Jerusalém. Como se fazia então a contagem? A sequência foi interrompida e retomada depois, ou continuou simplesmente?
Mas mesmo resolvendo este problema, há outro ainda. Há 24 turnos, portanto, cada um serve pelo menos duas vezes por ano.
Com base nos eventos astronómicos, sabemos que os magos chegaram a Belém por volta de 25 de dezembro do ano 2 a.C., quando Jesus já tinha nascido. Pouco tempo depois, Herodes morre.
Jesus nasceu seguramente no ano 2 ou 3 a.C.. Mas quando exatamente? Em que mês, em que dia? Isto continua incerto.
As opiniões divergem. Muitos apontam para um nascimento em 1 de Tishri (15 de setembro), o dia das Trombetas, do ano 3 a.C., em consonância com Apocalipse 12:1-2 e o evento astronómico que o versículo descreve (ver mensagens sobre a Estrela de Belém). É de facto um dia que simbolicamente se apresenta muito apropriado. Outros muitos continuam a defender a data tradicional próxima de 25 de dezembro. Há variadíssimas datas sugeridas para a semana em que oficiava Zacarias do turno de Abias.
Penso que esta questão ainda não tem bem fundamentados todos os dados necessários para se poder dar uma resposta segura.

[i] O que não está claro é se a repartição foi feita «Eleazar-Itamar-Eleazar Itamar etc. terminando com 8 turnos de Eleazar» ou se o sorteio foi feito assim «Eleazar-Eleazar- Itamar-Eleazar-Eleazar-Itamar etc.», já que o número de turnos de Eleazar era o dobro dos turnos de Itamar. Mas este é um pormenor que agora não intervém no caso.

[1] http://www.torahtimes.org/writings/machloqet-cohanim/article.html





22/05/2017

A ESTRELA DE BELÉM (3)

Continuação de A ESTRELA DE BELÉM (1) e (2)

Na mensagem anterior, vimos uma sequência de eventos astronómicos envolvendo o planeta Júpiter – o planeta Rei – culminando em 25 de dezembro com Júpiter numa posição estacionária e zenital sobre Belém.
Conjunções de planetas são eventos relativamente frequentes. Especial é a frequência e estreita proximidade dos planetas nas conjunções, bem como a sua localização numa mesma região do céu, nomeadamente nas constelações de Leo e Virgo, o que não pode deixar de formar em nossa mente associações com a simbologia e mensagem bíblica.
Se associarmos os eventos astronómicos com os eventos da narrativa bíblica, vemos que 25 de dezembro (ou uma data aproximada) foi o dia em que os magos chegaram a Belém.

Há indicações de que Jesus já tinha nascido quando os magos chegaram a Belém:
- O menino já não estava na manjedoura onde Maria o colocou depois de ter dado à luz (Lc 2:7) e onde os pastores o acharam (Lc 2:12, 15-16), mas ele estava numa casa (Mt2:11).
- A palavra com que a criança Jesus é identificada em Mateus 2 é diferente da que é usada na narrativa do nascimento e da visita dos pastores em Belém em Lucas 2.
Em Lc 2:12, 16, 21 é usada a palavra grega BREPHOS, que se refere a uma criança recém-nascida, ou ainda não nascida no caso da criança no ventre de Isabel (Lc 1:41, 44).
Na narrativa dos magos em Mt 2:8, 9, 11, 13, 14, 20, 21, é usada a palavra PAIDION, que se aplica normalmente a crianças. A mesma palavra é usada em Lc 2:40 – Crescia o menino (paidion) e se fortalecia. Por outro lado, PAIDION é usado em Lc 1:59 para o filho de Isabel e Zacarias, quando o foram circuncidar.
- Depois de inquirir da estrela que os magos viram, Herodes mandou matar as crianças com menos de dois anos de idade (Mt 2:16). O primeiro avistamento de Júpiter em estreita conjunção com Vénus foi em 12 de agosto 3 a.C.. Os magos chegaram a Jerusalém em dezembro de 2 a.C., cerca de 17 meses depois. Como as estrelas não davam certeza quanto a qual das conjunções significava o nascimento da criança, Herodes, para não correr riscos, deve ter arredondado o prazo a 2 anos.

A tradição de 25 de dezembro:
A origem da tradição de comemorar o nascimento de Jesus em 25 de dezembro não é muito clara.
A mais antiga referência a uma data para o nascimento de Jesus é de Hipólito de Roma (c.170-c.240) no seu Comentário sobre Daniel. O dia que ele indica é “oito dias antes das calendas de janeiro, uma quarta-feira, no 42º ano do reino de Augusto, 5500 anos desde Adão”, o que corresponde ao dia 25 de dezembro, e o 42º ano de Augusto é 3/2 a.C. (Finegan, #562). Um calendário romano do ano 354, Depositio martyrum, e um sermão no ano 386 de João Crisóstomo (pregador em Antioquia e mais tarde bispo de Constantinopla) referem a mesma data para a celebração do nascimento de Jesus em Belém (Finegan, #563).
Outra tradição data o nascimento de Jesus a 6 de janeiro, “treze dias depois do solstício de inverno”, segundo Epifânio (315-403). O solstício de inverno calhava então em 25 de dezembro. Clemente de Alexandria calculou a data de 18 de novembro (Finegan, #554). Outras referências antigas situam o nascimento de Jesus em abril, maio ou junho (Finegan, #554).
A opinião mais generalizada coloca a concepção na primavera e o nascimento no inverno (Finegan, #560, 569).
Relativamente ao dia 25 de dezembro, o que se destaca é uma possível associação com o dia do solstício de inverno, quando os dias começam de novo a crescer. A data atual do solstício é 21 de dezembro, mas naquele tempo 25 de dezembro era considerado o dia certo. Esse dia era um festival pagão em muitos lugares. Em Roma, existiam as Saturnálias que se festejavam por volta desse dia e, em 274, o Imperador Aureliano instituiu o festival de Deus Sol Invictus, o “sol invicto” sendo declarado a divindade oficial do Império. Quando o Imperador Constantino (323-337) aceitou o Cristianismo, 25 de dezembro passou a ser comemorado como nascimento de Cristo (Finegan, #568).
As datas de 25 de dezembro e 6 de janeiro podem ter sido fixadas por causa da associação com a data então aceite do solstício de inverno e com a expressa finalidade de substituir os festivais pagãos.
Eu interrogo-me se a data de 25 de dezembro não estará na realidade relacionada com o reconhecimento dos eventos astronómicos que levaram os magos a Belém. Eventos que foram depois esquecidos. E visto que 25 de dezembro teria sido a data em que os magos chegaram a Belém, deduziu-se que o nascimento de Jesus tenha acontecido nesses mesmos dias.

O que sugerem os eventos astronómicos de 3 e 2 a.C.?
Relembremos as datas da sequência de eventos:
Data 
Conjunção de planetas
12 agosto 3 a.C.
Vénus-Júpiter
11 setembro 3 a.C.
Mercúrio-Vénus
14 setembro 3 a.C.
Júpiter-Régulo
17 fevereiro 2 a.C.
Júpiter-Régulo
8 maio  2 a.C.
Júpiter-Régulo
17 junho 2 a.C.
Júpiter-Vénus
26 agosto  2 a.C.
Mars-Júpiter- Vénus- Mercúrio
25 dezembro 2 a.C.
Júpiter estacionário sobre Belém

Observamos que há duas conjunções dos planetas Júpiter e Vénus com um intervalo de cerca de 10 meses, a primeira em 12 de agosto 3 a.C. e a última em 17 de junho 2 a.C.. Um encontro de Júpiter, o planeta Rei, com Vénus, que representa a Mãe. Por exemplo, para os caldeus e os magos, Vénus era Ishtar, a mãe, a deusa da fertilidade.
Em 11 de setembro de 3 a.C. houve uma conjunção dos planetas Mercúrio e Vénus. Mercúrio é o Mensageiro. Podemos ver aqui a anunciação, o anjo Gabriel enviado a Maria (Lc 2:26-32)?
Além desta conjunção, o céu de 11 de setembro 3 a.C. lembra Apocalipse 12:1 – Viu-se um grande sinal no céu, a saber, uma mulher vestida de sol com a lua debaixo dos pés e uma coroa de doze estrelas na cabeça, que, achando-se grávida, grita com as dores do parto, sofrendo tormentos para dar à luz.
Esta passagem é altamente simbólica, mas ao mesmo tempo é possível olhar para a constelação de Virgo no céu e ver um “sinal” astronómico.
No período do nascimento de Jesus, o Sol no seu curso anual entrou na posição da cabeça da mulher em 13 de agosto aprox. e saiu dos seus pés aprox. 2 de outubro. Mas João viu a cena quando a mulher estava “vestida” ou “adornada” com o sol. Isto deverá indicar que a posição do sol na visão era algures a meio-corpo. A lua devia estar na localização exata debaixo dos pés quando o sol estava a meio do corpo. No ano 3 a.C. isto aconteceu durante uma hora e meio, como observado da Judeia ou de Patmos, no crepúsculo de 11 de setembro. O relacionamento começou às 18:15 (pôr do sol) e durou até 19:45 (pôr da lua). É o único dia em todo o ano que o fenómeno astronómico descrito no Apocalipse podia acontecer (MARTIN, capítulo 6).
O que é de destacar aqui é o facto de a lua estar no início da fase crescente, ou seja, indica o começo de um novo mês lunar. Esse dia era o primeiro dia de Tishri, o novo ano judaico, Rosh ha-Shanah, o Dia das Trombetas (Lev 23:23-26). Seria um dia expressivo para a chegada do Messias na terra, e por isso apontado por vários autores contemporâneos como o dia do nascimento de Jesus.
Fonte da imagem: Victor Paul Wierwille. Jesus Christ our promised seed (1982)

Olhando para os eventos astronómicos, apresentam-se várias alternativas para o nascimento de Jesus:
4 a.C.
3 a.C.
2 a.C.
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1) 25 de dezembro (chegada dos magos) como data do nascimento, situando a concepção na primavera, no mês de março.
2) 11 de setembro (Dia das Trombetas) como dia do nascimento, situando a chegada dos magos em dezembro 15 meses depois.
3) 11 de setembro como dia da anunciação (conjunção de Mercúrio e Vénus) e concepão. Isto situaria o nascimento 9 meses depois, o que corresponde à segunda conjunção Júpiter-Vénus em 17 de junho.

Em meu ver, a terceira opção – o nascimento em junho – é a mais aceitável, pelas seguintes razões:
Lc 1:26 diz que no 6º mês foi o anjo Gabriel enviado a Maria, a Nazaré na Galileia. Geralmente, é interpretado como sendo o 6º mês da gravidez de Isabel, por causa do v.36 que diz – E Isabel, tua parenta, igualmente concebeu um filho na sua velhice, sendo este já o sexto mês para aquela que diziam ser estéril.
Mas, em meu ver, é mais provável Lc 1:26 significar simplesmente que o acontecimento descrito em Lc 1:26-38 teve lugar no 6º mês do ano, que é o mês de Elul (agosto-setembro). E 11 de setembro enquadra-se aqui perfeitamente.
Se o anjo Gabriel foi ter com Maria no 6º mês do ano, nem 25 de dezembro nem 11 de setembro são opção para o dia de nascimento porque situam a concepção longe do 6º mês.
Com a concepção em setembro, Jesus pode ter nascido no 3º mês do ano seguinte, que é Sivan (maio-junho). E aqui enquadra-se a conjunção Júpiter-Vénus de 17 de junho.
Esse mês será também o da Festa das Semanas ou Pentecostes, que ocorre 50 dias depois da Páscoa (Lv 23). É uma ocasião igualmente simbolicamente significativa. E uma boa ocasião para José e Maria irem a Belém; e por isso uma boa razão para não haver lugar na estalagem (Lc 2:7), visto que muitos Judeus se deslocavam a Jerusalém para esta Festa. Belém fica muito próximo de Jerusalém.
Ap 12:1, sendo um versículo simbólico (e certamente não específico da figura de Maria, mas com uma abrangência muito maior), não obriga a situar o nascimento de Jesus em 11 de setembro. Podemos interpretar este versículo como condensando numa só frase todo o período de gravidez, desde a concepção até ao dar à luz, não invalidando o significado do Dia das Trombetas como início de uma nova era com a encarnação de Jesus.
Se Jesus nasceu em junho, ele teria então cerca de 6/7 meses aquando da chegada dos magos.
Jesus nasceu quando José e Maria foram a Belém para alistar-se, conforme requerido pelo decreto de César Augusto convocando toda a população do império para recensear-se (Lc 2:1-6). Lembramos que em fevereiro de 2 a.C. Augusto recebeu o título de Pater Patriae, havendo uma grande probabilidade que o “recenseamento de Quirino” tenha a ver com este facto (ver mensagem O RECENSEAMENTO DE QUIRINO). Era requerido de todas as pessoas, cidadãos romanos e outros, em todo o Império e suas províncias, um juramento de lealdade. Se o decreto emanou do próprio Augusto, penso ser possível concluir que o censo foi conduzido depois de fevereiro.


Assim, as evidências bíblicas, históricas e astronómicas parecem convergir em junho de 2 a.C. para a data do nascimento de Jesus