DE CIRO A JESUS (1) – o problema
cronológico
O período que
vai do decreto de Ciro até Jesus Cristo é o período mais controverso de toda a
Bíblia em matéria de cronologia.
A única
informação bíblica que nos permite calcular este lapso de tempo é a profecia de
Daniel, capítulo 9, das 70 semanas. A controversa está em que o tempo indicado
pela profecia não corresponde ao tempo da cronologia secular académica.
Na
cronologia secular, Jerusalém sucumbiu a Nabucodonosor da Babilónia no ano 586
a.C. e o decreto de Ciro é datado aproximadamente 536 a.C. Baseado nestes datas,
o número de anos decorridas desde o decreto de Ciro até ao início do ministério
de Jesus, que assumimos como tendo sido no ano 26 d.C., seriam 562 anos.
A profecia
de Daniel 9 dá 483 anos desde o
decreto de Ciro – quando consideramos este como a “saída da ordem para
restaurar e para edificar Jerusalém” (Dn 9:25) – até ao ano do batismo de Jesus
e início do seu ministério público (“até ao Ungido”), que e o fim da 69ª (7 +
62) semana.
Interpretando
literalmente os anos da profecia de Daniel, o decreto de Ciro seria
aproximadamente em 457 a.C.
A cronologia
secular apresenta assim um excesso de 79 anos em comparação com a cronologia
profética das semanas de Daniel. Falaremos em cronologia longa (secular) e
cronologia curta (bíblica).
Embora a
maioria dos comentadores evangélicos assumam que a Bíblia tem razão, assumem
que também podem confiar na investigação de historiadores seculares e aceitam
as datas propostas para a queda de Jerusalém e o decreto de Ciro. Porém, como
neste caso as duas cronologias não correspondem, têm procurado soluções de
consenso, que deem razão à Bíblia sem pôr em causa as datas consensuais. Os que
consideram que as 70 semanas de Daniel devem ser tomadas literalmente como 490
anos procuraram um decreto alternativo ao de Ciro como ponto de partida da
profecia. Falámos dos vários decretos na mensagem O decreto de Ciro (2)
(setembro 2015). Outros, para resolver a questão, intercalam lapsos de tempo
entre os vários blocos da profecia (7 semanas – 62 semanas – 1 semana).
Outros consideram
que as “setenta semanas” têm um valor meramente simbólico, que não tem que ser
interpretado literalmente.
Retomemos o fio da história a partir
do decreto de Ciro:
Já defendi
extensamente que as primeiras 7 semanas (49 anos) da profecia de Daniel 9 correspondem
ao tempo do regresso dos judeus a Jerusalém com o decreto de Ciro até ao 32º
ano de Dario Histaspes, ano em que se celebrou a dedicação dos muros
reconstruídos no tempo de Neemias (ver mensagens sobre a Cronologia das 7 semanas (outubro 2015 a janeiro 2016). Esta
história é contada nos livros de Esdras e Neemias. Também o livro de Ester
situa-se cronologicamente neste período.
Depois do
32º ano de Dario, quando Neemias regressou a Susã depois de reconstruídos os
muros de Jerusalém (Ne 13:6), não há mais nenhuma indicação cronológica no
Velho Testamento que nos possa ajudar, salvo o que está na profecia de Daniel 9.
Depois das
primeiras 7 semanas, segue-se um período de 62 semanas (434 anos) até ao Ungido.
Isto é, até ao batismo de Jesus e início do seu ministério terreno. No meio da
última (70ª) semana, Jesus “fez cessar o sacrifício e a oferta de manjares”,
que se tornaram obsoletos com a sua morte na cruz e ressurreição (ver mensagens
sobre a Profecia das setenta semanas de
Daniel (agosta e setembro 2015).
O que aconteceu no período das 62
semanas?
Primeiro, o tempo
restante do domínio Persa depois do 32º ano de Dario até à conquista da Pérsia
por Alexandre o Grande em 330 a.C.
À morte de
Alexandre em 323 a.C., o seu reino é dividido em quatro. Ptolomeu assegura o
controlo do Egipto e incorpora a Judeia nos seus domínios. Seleuco governa em Síria
e Ásia Menor.
A Judeia era
objeto de cobiça entre os dois rivais.
Em 198 a.C.,
Antíoco III derrota os egípcios e incorpora Judeia no seu império. Inicialmente
concede aos Judeus uma certa autonomia, mas depois de uma derrota infligida pelos
Romanos, Antíoco III começa um programa de helenização ameaçando forçar os
Judeus a abandonarem o seu monoteísmo pelo paganismo grego. Antíoco retrocede
face à oposição dos Judeus à sua tentativa de introduzir ídolos no templo, mas
o seu filho, Antíoco IV, Epifânio, retoma e endurece a política helenizante do
seu pai. Proibiu práticas da Lei como o sábado e a circuncisão, e profanou o
templo erigindo um altar a Zeus, e permitindo o sacrifício de porcos e o acesso
dos não-judeus ao templo.
Em reação,
os Judeus revoltaram-se, liderados pelo sacerdote Matatias e seus cinco filhos.
À morte de Matatias, a revolta é conduzida por Judas Macabeu, nome pelo qual esta
família passou a ser conhecida. Em 164 a.C. Jerusalém é libertada e o templo
purificado, dando origem à festa de Hanukkah.
No fim desta
guerra que durou duas décadas, Simão era o único dos filhos de Matatias ainda
vivo. A Judeia recebeu a sua independência e, em 142 a.C., Simão Macabeu começa
a reinar em Judá. Os Macabeus, também conhecidos como a dinastia dos Asmoneus, ocuparam
o trono de Judá, bem como o ofício de sumo-sacerdote, que pertencia à
descendência de Aarão e tribo de Levi. Isto foi motivo de conflito e
aparecimento de fações rivais que ameaçavam a unidade da nação.
Quando em 67
a.C. a rainha Salomé Alexandra morreu, a dinastia entrou em declínio. Os seus
dois filhos lutaram pelo direito de sucessão, conduzindo a uma guerra civil.
Esta guerra interna foi uma oportunidade para Roma conquistar o controlo sobre a
Judeia em 63 a.C.
Em 38 a.C.,
apoiado por Roma, Herodes torna-se rei da Judeia. Jesus nasce durante o governo
do rei Herodes (Lc 1:5), e começa o seu ministério quando Herodes Antipas, um
dos filhos de Herodes, era tetrarca da Galileia (Lc 3:1).
Onde se situa o problema da
cronologia deste período?
Todo o
problema situa-se no tempo que resta do Império Persa depois do 32º ano de
Dario até à conquista da Pérsia por Alexandre em 330 a.C..
Na
interpretação literal do tempo profetizado por Daniel, restam cerca de 78
anos para o Império Persa entre o 32º ano de Dario e o fim do Império. Isto
daria um total de 127 anos para o império persa desde o primeiro ano de Ciro
até Alexandre o Grande.
De acordo
com a cronologia secular, que assume que a data da destruição de Jerusalém é
586 a.C., e o decreto de Ciro 536 a.C., o tempo que restaria para o Império
Persa entre o 32º ano de Dario e o fim do Império é de 157 anos.
Há 79 anos a
mais na cronologia consensual do império Persa.
Como
resolver esta discrepância? A Bíblia permite-nos encurtar o tempo deste
período?
É sobre esta
questão que nos vamos debruçar nas próximas mensagens.