Assuero
Já
avançámos, numa anterior mensagem (Quem é
o Artaxerxes de Esdras e Neemias?), que o rei Assuero no livro de Ester é o
mesmo que o Artaxerxes de Esdras e Neemias, e que este é Dario o Persa. Em Annals of the World (1650), já o bispo
Ussher situava Ester no reinado de Dario.
Geralmente,
assume-se que o Assuero de Ester é Xerxes, o sucessor de Dario, talvez por
causa da semelhança de nomes. Assuero e Xerxes seriam corrupções do persa
Khshyarsha. Mas vários aspetos apontam para a identificação com Dario.
Alguns
comentadores identificam Assuero com Cambises, o que é improvável, dado ele ser
adverso aos judeus.
J. Jordan assinala seis pontos que defendem que Assuero é Dario (Jordan, J. -
Esther: Historical & Chronological comments (V), Biblical Chronology, nº 6, 1996):
- Segundo
a história, Dario teve de passar os primeiros dois anos do seu reinado a
reprimir rebeliões. Assim tem lógica o facto de dar uma grande festa no seu
terceiro ano.
-
Depois disso, Dario fez várias campanhas militares. Assim, ao seu regresso a
Susã (sexto ano), e apaziguado o seu furor contra Vasti, é um bom momento para
escolher uma nova esposa.
- A
frota naval de Dario tomou as ilhas de Samos, Chios e Lesbos e as restantes
ilhas gregas. Segundo Heródoto, estas ilhas pagavam tributo a Dario. Outras
fontes históricas dizem que Dario subjugou as ilhas no mar Egeu e que todas
foram perdidas por seu filho Xerxes antes do 12º ano do seu reino, o que
elimina a hipótese de Xerxes ser Assuero.
-
Dario foi o rei persa que instituiu uma reforma económica, normalizou pesos,
medidas e cunhagem, e impôs tributo sobre os povos que subjugou. A notícia
sobre a imposição de tributo sobre toda a terra (Ester 10:1) não se pode
aplicar a um rei persa anterior, e deve referir-se a Dario visto que se trata
de um imposto sobre as terras do mar (e Xerxes já não ter domínio sobre estas).
- Dario
é chamado Artaxerxes em Esdras e Neemias, como já tive ocasião de referir. Nas
adições apócrifas de Ester, e na Septuaginta, o rei de Ester é chamado
Artaxerxes.
-
E, no livro apócrifo 1Esdras 3:1-2 lê-se «o rei Dario deu um banquete …». Este
versículo é cópia do versículo de Ester 1:3, mas em vez de usar o nome Assuero,
usa Dario.
- Além disso, no 20º ano de Artaxerxes/Dario, quando Neemias foi falar
com o rei sobre a sua preocupação com Jerusalém, a rainha estava sentada ao lado dele (Ne 2:6). Este pormenor
realmente só faz sentido aqui se a rainha era Ester.
Mordecai
Mordecai criou Ester, filha de seu tio, a qual não tinha pai nem mãe (Es
2:7). Portanto, Mordecai e Ester são primos. É possível, numa família grande,
existirem grandes diferenças de idade entre primos, e sobrinhos serem mais
velhos do que seus tios. Mordecai podia ter a mesma idade que o seu tio (pai de
Ester), ou mesmo mais, se o pai de Mordecai era muito mais velho do que o seu
irmão mais novo (pai de Ester) e Mordecai um dos filhos mais velhos. E se Ester
era uma filha mais nova, é possível existir uma diferença de idade entre eles
de mais de 50 anos, como terá sido o caso.
O nome de Mordecai encontra-se na lista dos que regressaram a Jerusalém
com Zorobabel e Jeshua (Ed 2:2). Na ausência de outro qualificativo, podemos
assumir que se trata do mesmo Mordecai do livro de Ester. Mordecai fora
transportado de Jerusalém com os exilados deportados por Nabucodonosor com
Jeconias (Joaquim), rei de Judá (Ester 2:5-6), no ano 3406. Assumindo que era recém-nascido quando foi deportado, Mordecai
já tem 84 anos no 7º ano de Dario. Se Assuero fosse Xerxes, e Dario reinou 36
anos, Mordecai teria mais de 120 anos quando se deu o episódio de Haman (no ano
12º do rei) e a perseguição aos judeus. Esta longevidade não é consentânea com
a época. Por isso, para defender que Assuero é Xerxes, há comentadores que
argumentam que não foi Mordecai que fora transportado para Babilónia, mas sim Quis,
um antepassado de Mordecai. Mordecai é identificado como benjamita, filho de
Jair, filho de Simei, filho de Quis (Es 2:5), o que muito bem pode indicar que
a genealogia de Mordecai remonta a Quis, pai de Saul (1Sm 9:1-2). E a figura de
Simei, da casa de Saul, aparece no tempo de David (2Sm 16:5-11; 19:16-23).
Hamã
Hamã
era agagita, adversário dos judeus (Es 3:10). Isto é, era descendente de Agague,
o rei amalequita que foi vencido por Saul, embora este lhe poupasse a vida, mas
depois foi morto por Samuel (1Sm 15). A promessa de Deus relativamente a
Amaleque era: porque eu hei de riscar
totalmente a memória de Amaleque de debaixo do céu (Ex 17:14). Saul teve a
oportunidade, mas não o fez. Agora a vitória final sobre Amaleque será obtida
através de Ester e Mordecai.
Cronologia
dos acontecimentos no livro de Ester
No 6º ano de Assuero/Dario, por volta do 10º mês, Ester foi levada à
casa do rei, onde havia de ser cuidada por 12 meses (Es 2:12), para cumprir os
dias do seu embelezamento, antes de ser levada ao rei.
3490
AH – 7º ano de Dario
Assim foi levada Ester ao rei
Assuero, à casa real, no décimo mês, que é o mês de tebete, no 7º ano do
seu reinado. O rei amou a Ester mais do que a todas as mulheres, e ela alcançou
perante ele favor e benevolência mais do que todas as virgens; pôs-lhe na
cabeça a coroa real, e a fez rainha em lugar de Vasti (Es 2:16-17). Durante doze meses, desde o
6º ano de Dario, ela havia sido preparada (Es 2:12).
3491
AH – 8º ano de Dario
Já
sendo Ester rainha, Mordecai toma conhecimento de uma trama contra o rei e o
revelou à rainha Ester que o disse ao rei, em nome de Mordecai.
3494
AH – 11º ano de Dario
Em
atenção aos acontecimentos no 12º ano (Es 3:7), terá sido no 11º ano de Assuero/Dario
que o rei engrandeceu a Hamã, filho de Hamedata, agagita, e o exaltou, e lhe
pôs o trono acima de todos os príncipes. (Es 3:1). Estava ordenado que todos
tinham de se inclinar perante ele, mas Mordecai recusou-se. Ele declarou que
era judeu.
Hamã
ficou furioso porque Mordecai não se inclinava nem se prostrava perante ele planeou,
não só atentar contra Mordecai, mas destruir todos os judeus, povo de Mordecai,
que havia em todo o reino de Assuero (Es 2:5-6).
3495
AH – 12º ano de Dario
No
1º mês, mês de Nisan, lançou-se Pur, isto é, sortes perante Hamã, dia a
dia, mês a mês, até ao 12º, que é o mês de Adar (Es 3:7).
Então,
no final do ano, Hamã vai dizer a Assuero que há um povo que não cumpre as leis
do rei e que não pode ser tolerado, pedindo-lhe para decretar que sejam mortos.
O rei deu-lhe o seu anel e autorizou Hamã a levar a cabo o seu intento. Até
então, Assuero não sabia que Ester era judia, porque Mordecai tinha-lhe
instruída para não declarar a sua linhagem (Es 2:20).
3496
AH – 13º ano de Dario
Com
a autorização do rei, chamaram os secretários do rei no dia 13 do 1º mês.
Em nome do rei, e com o seu selo, escreveram-se e enviaram-se cartas aos
sátrapas do rei, aos governadores de todas as províncias e aos príncipes de
cada povo; a cada província no seu próprio modo de escrever, e a cada povo na
sua própria língua. A ordem era para que se destruíssem, matassem e
aniquilassem de vez a todos os judeus moços e velhos, crianças e mulheres, em
um só dia, no dia 13 do 12º mês, e que lhes saqueassem os bens. As
cartas foram enviadas a todos os povos para que se preparassem para aquele dia
(Es 3:12-15).
Depois
de tomar conhecimento de tudo isto, Mordecai informa Ester e pede-lhe para ir falar
com o rei e pedir misericórdia pelo seu povo.
Neste
intervalo dão-se os acontecimentos descritos nos capítulos 4 a 8 de Ester.
A
intervenção de Ester junto ao rei fez com que ele ordenou que se escrevesse aos
judeus, em nome do rei, o que bem lhes parecesse, porque o anterior decreto
selado com o seu anel, não podia ser revogado (Es 8:1-8).
Então,
no dia 23 do 3º mês chamaram-se novamente os secretários do rei. E,
segundo tudo quanto ordenou Mordecai, se escreveu um édito para os judeus, para
os sátrapas, para os governadores e para os príncipes das províncias que se
estende da Índia a Etiópia, 127 províncias. Nas cartas o rei concedia aos
judeus de cada cidade que se reunissem e se dispusessem para defender a sua
vida, para destruir, matar e aniquilar de vez toda a qualquer força armada do
povo da província que viessem contra eles, crianças e mulheres, e que se
saqueassem os seus bens, num mesmo dia, em todas as províncias do rei Assuero,
no dia 13 do 12º mês. A carta, que determinava a proclamação do édito em
todas as províncias, foi enviada a todos os povos, para que os judeus se
preparassem para aquele dia, para se vingarem dos seus inimigos (Es 8:9-14).
Houve
alegria e regozijo entre os judeus, e muitos dos povos da terra se fizeram
judeus, porque o temor dos judeus tinha caído sobre eles (Es 8:15-17).
O dia
13 do 12º mês era o dia em que os inimigos dos judeus contavam
assenhorear-se deles, mas sucedeu o contrário, pois foram os judeus que se
assenhorearam dos que os odiavam. Em todas as províncias se ajuntaram para dar
cabo daqueles que lhes procuravam o mal; e ninguém podia resistir-lhes, porque
o terror que inspiravam caiu sobre todos aqueles povos. Os príncipes das
províncias, os sátrapas e governadores e oficiais do rei auxiliavam os judeus.
Feriram,
pois os judeus a todos os seus inimigos, a golpes de espada, com matança e
destruição; e fizeram dos seus inimigos o que bem quiseram.
Na
cidadela de Susã, os judeus mataram 500 homens e os 10 filhos de Hamã; nas
províncias, mataram 75.000.
Em
Susã, no dia 14, os judeus tiveram autorização de fazer segundo o mesmo édito,
e mataram mais 300 homens (Es 9:13-15).
No
dia 14 do mês, descansaram e o fizeram dia de banquetes. Em Susã, no dia 15.
Na
sequência desta vitória sobre o inimigo, Mordecai ordenou aos judeus que
comemorassem o dia 14 e o dia 15 do mês de Adar, 12º mês, como os dias em que
os judeus tiveram sossego dos seus inimigos (Es 9:20-21). A festa passou a
chamar-se Purim, porque Haman tinha lançado Pur, isto é, sortes, para destruir
os judeus. Mas o seu intento recaiu sobre a sua própria cabeça.
Depois
disto, o rei Assuero impôs tributo sobre a terra, e sobre as terras do mar (Es
10:1). É provável que seja a este tributo que se refere Neemias 5:4. Mais um
ponto a favor da identificação de Assuero com Dario/Artaxerxes de Neemias.
Os
acontecimentos no 12º ano de Assuero e a esmagadora vitória dos judeus, tiveram
consequências positivas para os judeus. Mordecai foi exaltado. Foi o segundo depois do rei Assuero, e
grande para com os judeus, e estimado pela multidão de seus irmãos, tendo
procurado o bem-estar do seu povo e trabalhado pela prosperidade de todo o povo
da sua raça (Es 10).
Cronologicamente,
o livro de Ester situa-se antes do livro de Neemias.
Por
isso, quando Neemias vai ter com o rei no 20º ano de Artaxerxes/Dario/Assuero, ainda
os acontecimentos dramáticos de poucos anos antes estavam frescos na memória, e
é compreensível a facilidade com que Neemias recebe autorização e apoio para ir
a Jerusalém, ajudar os judeus. A rainha estava sentada junto ao rei e Mordecai,
se ainda vivo, era o segundo do rei Assuero.