24/11/2017

JOÃO 2:20


Respondeu-lhes Jesus: Derrubai este templo, e em três dias o levantarei. Disseram-lhe então os judeus: Em quarenta e seis anos foi edificado este templo, e tu o levantarás em três dias? (Jo 2:19-20)

Estes 46 anos podem ajudar-nos com a cronologia da vida de Jesus?

O templo e o santuário

Observamos que nesta mesma passagem da purificação do templo (Jo 2:13-22), o Grego tem duas palavras diferentes traduzidas ‘templo’.

No v. 14 - No templo, Jesus encontrou os vendedores de bois, de ovelhas … - e no v. 15 - Tendo feito um chicote, expulsou todos do templo … a palavra grega é íeron (hieron).

Nos vs. 19, 20 e 21 é usada a palavra naoς (naos). Algumas versões (ex. Bíblia de Jerusalém) traduzem esta palavra como ‘santuário’.

‘Hieron’ refere-se ao inteiro recinto do templo, incluindo os átrios, os pórticos e todas as dependências, ou seja, o espaço público onde todos os israelitas podiam entrar.

O ‘naos’ é o santuário interior: o lugar santo, onde apenas os sacerdotes podiam entrar, e o santo dos santos, apenas o sumo-sacerdote uma vez no ano.

Esta diferença é clara em João que utiliza sempre ‘hieron’ (Jo 5:14; 7:28; 8:20; 18:20) e ‘naos’ apenas nesta passagem de 2:19-21. A mesma diferenciação encontramos por ex. em Mc 11:11 (hieron) e 15:38 (naos).

Segundo Josefo, Herodes empreendeu a muito grande tarefa de (re)construir o templo no 18º ano do seu reinado (Ant. 15.380). Mas numa parte do templo, nem o rei podia entrar, e Herodes não entrou no santuário porque ele não era sacerdote. Ele tratou da obra dos átrios e espaços exteriores (periboloς é o termo usado por Josefo em Guerras 1.401); e estes construiu em oito anos (Antiguidades 15.420). O santuário interior (naoς) foi construído pelos próprios sacerdotes e isto em um ano e seis meses (Ant. 15.421). Quando o ‘naos’ foi acabado de construir houve grande alegria e celebrou-se uma festa.

Portanto, deduzimos que os 46 anos indicados pelos judeus em Jo 2:20 têm referência à construção do “naos” (santuário interior) pelos sacerdotes e não do templo (hieron) na sua totalidade por Herodes.

Ainda tem a questão do verbo oikodomhjnh (Jo 2:20), que é um aorista indicativo passivo, significando literalmente “foi construído” e compreende-se melhor como já estando erguido há 46 anos, não se referindo à duração do ato de construir (Finegan § 595).

Josefo diz que a festa de celebração da obra do “naos” coincidiu com o dia da inauguração do rei (Ant. 15.423). Uma fonte extra bíblica, o Tratado Rosh Hashanah no Mishna, elucida que o Ano Novo para reis é 1 de Nisan (Finegan § 164).

Este diálogo sobre o ‘naos’ tem lugar na primeira páscoa do ministério de Jesus. A páscoa celebra-se em 14 de Nisan.

Assim, na primeira Páscoa (no mês de Nisan) do ministério de Jesus tinham passado 46 anos desde que se celebrou a edificação do “naos” do templo.
Agora trata-se de descobrir qual o ano.

Cronologia do reinado de Herodes segundo Josefo

Herodes foi nomeado rei pelos Romanos, quando Calvino e Pollione eram cônsules (Ant. 14.389). Isto é o ano 40 a.C.. Era costume em Roma designar o ano pela menção dos dois cônsules em exercício nesse ano. Os cônsules eram eleitos por um ano. Bastava a referência aos dois cônsules para determinar o ano (Finegan § 172).

Depois de um cerco de vários meses, Herodes conquista Jerusalém pela força, em outubro, no dia da Expiação (Tishri 10). O cerco começara no início desse mesmo ano – no terceiro ano desde que fora feito rei em Roma –, depois de passado o rigor do inverno (Ant. 14.465), e continuou durante o verão (Ant. 14.473).

Mas quanto ao ano em que isto aconteceu, Josefo não é coerente. Ele diz que foi no ano em que Agrippa e Gallo eram cônsules – isto seria 37 a.C. – e 27 anos depois que Pompeu conquistou Jerusalém (em 63 a.C.) – isto seria 36 a.C.

A isto acresce outra dificuldade: se o ano novo para reis é 1 de Nisan, a partir de Nisan de que ano é contado o reinado de Herodes? Nisan antes da conquista, sendo o primeiro ano um ano incompleto mas ainda assim considerado o primeiro ano? Ou a partir de Nisan depois da conquista, havendo assim um “ano de acessão” (um período de alguns meses) não contado?

Como resolver este problema?

No ano 31 a.C., em 2 de setembro, teve lugar a batalha de Actium, em que Octaviano (mais tarde conhecido como Augusto) derrota Marco António. Josefo afirma que este ano corresponde ao 7º ano de Herodes (Ant. 15.121).

Assim sendo, o 7º ano de Herodes corre de Nisan 31 a.C. a Nisan 30 a.C.

Por conseguinte, o 1º ano de Herodes começa oficialmente em Nisan de 37 a.C., a conquista de Jerusalém em outubro desse mesmo ano.

Isto também está de acordo com Ant. 14.465, onde Josefo diz que o cerco a Jerusalém começou depois do rigor do inverno, no terceiro ano desde que fora feito rei em Roma.

O 18º ano de Herodes, quando empreende a obra do templo, corresponde então a Nisan 20 a.C. a Nisan 19 a.C.

O ‘naos’ durou um ano e seis meses a construir. A festa foi celebrada em Nisan na mesma data que a da inauguração rei. Isto significa que a edificação do ‘naos’ terá sido celebrada no final do décimo-nono ano de Herodes, em Nisan de 18 a.C.

46 anos depois (Jo 2:20) leva-nos ao ano 29 d.C.,  à páscoa em que ocorre o que está descrito em João 2:13-21 e a primeira páscoa do ministério de Jesus.

Disto deduzimos que Jesus iniciou o seu ministério na páscoa de 29 d.C..

Podemos provar que isto está correto com o apoio de outros testemunhos?

O nascimento de Jesus

Nas anteriores mensagens chegámos à conclusão que Jesus nasceu em data incerta do ano 2 a.C., antes da vinda dos magos a Belém (em aprox. 25 de dezembro de 2 a.C.) e antes da morte de Herodes que ocorreu pouco depois do eclipse de 10 de janeiro 1 a.C.

Jesus foi batizado ainda ele não tinha 30 anos. Começava a ser de quase trinta anos (Lc 3:23). Tinha quase. Se nasceu em 2 a.C., tem 29 anos em 28 d.C. e completa 30 anos no ano 29 (o ano da primeira páscoa).

Jesus nasceu cerca de 5 meses depois de João Batista.

João Batista era de família sacerdotal. Começou a sua pregação no 15º ano de Tibério, entre agosto/setembro do ano 28 e agosto/setembro do ano 29, quando fez 30 anos (ver mensagem O ANO QUINZE DE TIBÉRIO, julho 2017).

Admitindo que João começou a pregar logo no início do 15º ano de Tibério (ano 28), em agosto, Jesus não podia fazer 30 anos antes de finais de janeiro/fevereiro do ano 29. Mas pode ter sido batizado por João um pouco antes, no fim do ano 28 ou princípio do ano 29, e começado o seu ministério na páscoa do ano 29 que nesse ano terá sido em 18 de abril. Este prazo dá tempo suficiente para integrar os eventos descritos por João entre o batismo e a primeira páscoa. O batismo foi imediatamente seguido pelo período de 40 dias no deserto (Mc 1:12). Depois da temporada no deserto, Jesus regressa onde João estava a batizar (Jo1:36) e este o vê passar. Dois dos discípulos de João vão atrás de Jesus e ficam com ele aquele dia (Jo1:37-42). No dia seguinte, Jesus quis ir a Galileia (Jo 1:43) e no terceiro dia, está presente nas bodas de Caná na Galileia (Jo 2:1). Depois desce a Cafarnaum (a norte do mar da Galileia) onde ficou “não muitos dias” com os primeiros discípulos antes de subir para a sua primeira páscoa em Jerusalém. Não sabemos quantos dias são “não muitos dias”, mas como João não menciona qualquer acontecimento entre Cafarnaum e a primeira páscoa, não deve ter sido um período muito longo. Pouco mais de 60 dias terão decorrido entre o batismo e a descida a Jerusalém.

Esta data de finais de janeiro/fevereiro do ano 2 a.C. para o nascimento de Jesus enquadra-se também muito bem com o recenseamento/juramento associado ao título de Pater Patriae de Augusto recebido em fevereiro de 2 a.C. (ver mensagem RECENSEAMENTO DE QUIRINO, fevereiro 2017) razão pela qual José e Maria se deslocaram a Belém.

Também Josefo faz referência a um juramento situando-o entre 12 a 15 meses antes da morte de Herodes, portanto, dentro do período em consideração: todo o povo dos judeus deu garantias da sua boa vontade para com César e o governo do rei, mas mais de 6.000 dos fariseus recusaram-se a fazer o juramento (Ant. 17.42). Tudo indica que se trata do mesmo alistamento de Lucas.

Por outro lado, esta hipótese não se enquadra com as datas astronómicas do aparecimento e progressão da “estrela de Belém” (ver mensagens A ESTRELA DE BELÉM, maio 2017). Apenas o efeito “coroa”, isto é o movimento circular visível de Júpiter por cima da estrela Régulo devido à retrogressão em 29 de novembro 3 a.C. e o retomar da sua rota normal em 29 de março 2 a.C., pode parecer uma aproximação à data de nascimento de Jesus. Mas não quero atribuir muita importância à sequência e datas dos eventos astronómicos, embora bastante extraordinários. Fora o facto de os magos terem seguido uma estrela, provavelmente o planeta Júpiter, e chegado a Belém num período em que Júpiter estava numa posição estacionária e zenital sobre Belém, o que ocorreu astronomicamente no final do ano 2 a.C., e o prazo de dois anos para baixo definido para a matança das crianças de Belém associado ao tempo do nascer da estrela (Mt 2:16), não há mais indicações bíblicas de que as datas das várias e sucessivas conjunções de planetas em 3 e 2 a.C. tenham correspondência exata com datas de concepção e nascimento de Jesus.

Na mensagem A ESTRELA DE BELÉM (3) cheguei a considerar a possibilidade de usar as datas astronómicas da progressão de Júpiter para determinar a data do nascimento de Jesus. Apresentavam-se várias alternativas: 11 de setembro de 3 a.C. (por causa de Ap 12:1), 17 de junho 2 a.C. e 25 de dezembro 2 a.C. (a interpretação tradicional). A solução melhor pareceu-me então a do nascimento em junho, quando aliada à interpretação do 6º mês da anunciação (Lc 1:26) não como o 6º mês da gravidez de Isabel mas como o 6º mês do ano. O que também anularia a necessidade de estabelecer com exatidão a semana do turno de Abias.

Agora, porém, nenhuma destas hipóteses me parece válida, quando temos em conta a referência aos 46 anos da construção do santuário.

A data de 11 de setembro (Tishri 1) 3 a.C. é defendida por alguns por analogia com Apocalipse 12:1-2. Mas em meu ver este é um versículo altamente simbólico, nem específico da figura de Maria, mas alargável a Israel e a Igreja. No limite pode-se interpretar este versículo como condensando numa só frase todo o período da gravidez, desde a concepção até ao dar à luz. Além disso, com o nascimento em 11 de setembro 3 a.C., Jesus completaria 30 anos em 28 d.C., demasiado cedo portanto, além de não se enquadrar com o 15º ano de Tibério para João Batista e existir um prazo demasiado longo entre o batismo com quase 30 anos e a primeira páscoa em 29.

Com o nascimento em junho de 2 a.C. Jesus não teria ainda 30 anos na primeira páscoa do seu ministério no ano 29. O que poderá não ser um impedimento, já que Jesus não era de família sacerdotal como João Batista e nada indica que teria obrigatoriamente que ter 30 anos. Mas Lucas 3:23 diz que Jesus começava a ser de quase trinta anos quando foi batizado e logo de seguido levado ao deserto para a tentação de 40 dias. Mas como já dissemos acima, terá havido pouco mais de 60 dias entre o batismo e a páscoa. Com estes cerca de 60 dias até à páscoa e ainda o tempo até ao mês de junho há demasiado tempo para fazer (quase) trinta anos. Portanto, esta hipótese também não se coloca. A não ser que a primeira páscoa seja no ano 30 d.C. Mas nesse caso, o tempo entre o batismo com quase 30 anos e a páscoa do ano 30 é um prazo demasiado comprido para os poucos eventos descritos em João ocorridos antes da primeira páscoa (ver também mensagem A DURAÇÃO DO MINISTÉRIO DE JESUS, setembro 2017).

Muito menos é válida a hipótese (tradicional) do nascimento em 25 de dezembro 2 a.C. Esta situaria necessariamente a primeira páscoa no ano 30.

Concluindo:
Depois de todas as mensagens ao longo do ano 2017, em que procurei estabelecer a data do nascimento de Jesus, a minha proposta é que Jesus nasceu no ano 2 a.C. em janeiro/fevereiro, por me parecer a data que melhor concilia os dados bíblicos com os extra-bíblicos, sem torcer o que diz a Bíblia para encaixar nos dados extra-bíblicos.

Bibliografia
The Works of Josephus. Translated by William Whiston. New updated edition. 1987

Jack Finegan. Handbook of biblical chronology. Revised edition 1998

21/09/2017

A DURAÇÃO DO MINISTÉRIO DE JESUS

A duração do ministério de Jesus, desde o seu batismo até à crucificação, é outra questão controversa. Tanto tem sido escrito sobre esta questão, com o foco nas contradições entre os evangelhos sinópticos e João, que tenho receio de enveredar-me neste caminho.

Há várias teorias, que vão de um ministério de um só ano até cinco anos, e mesmo mais. A teoria mais generalizada é que foram cerca de 3 anos e meio. Também há desacordo sobre qual o ano em que Jesus começou o seu ministério e o ano em que foi crucificado. Entram em linha de conta cálculos astronómicos de calendários e a datação de eventos como o 15º ano de Tibério, os 46 anos da construção do templo (Jo 2:20), a morte de João Batista ligada à questão de Herodias (Lc 3:19) e outros.

Face a todas as teorias e tentativas de resolver a questão, fiquei no entanto com a impressão de que foi posta de lado a simplicidade do relato bíblico – apesar de este revelar algumas contradições - e passaram a ser elementos extra-bíblicos a dominarem o debate e datas da cronologia secular a procurar definir a cronologia bíblica, fazendo esquecer o que está escrito e tentando ler e inscrever no texto o que não está mas é sugerido por datas calculadas.

Convém analisar primeiro a nossa fonte primária, o Novo Testamento.

Os evangelhos sinópticos (Mateus, Marcos e Lucas) dão pouca informação cronológica. Apenas mencionam uma Páscoa, que é a última quando Jesus foi crucificado. Por isso, alguns dizem que o ministério de Jesus não durou mais do que um ano.

O evangelho de João dá-nos informações mais específicas. João menciona expressamente várias festas ao longo do ministério de Jesus, sendo a festa da Páscoa determinante na compreensão da cronologia. A não ser que o evangelista tenha omitido uma ou mais Páscoas (mas por que razão?), o relato contém apenas 3 Páscoas, significando que o seu ministério só durou pouco mais de 2 anos, com o batismo algum tempo antes da primeira Páscoa.

Com base no evangelho de João, acrescido de alguns dados dos outros evangelhos, procurei construir uma cronologia para tentar descobrir a duração do ministério de Jesus:

- O batismo de Jesus foi imediatamente seguido de 40 dias no deserto (Mc 1:12).

- Depois da temporada no deserto, Jesus regressa onde João Batista está a batizar (Jo 1:36); e este o vê passar. Dois dos discípulos de João vão atrás de Jesus e ficam com ele aquele dia (Jo 1:37-42).

- No dia seguinte, Jesus quis ir a Galileia (Jo 1:43), e

- No terceiro dia, ele já está presente nas bodas em Caná da Galileia (Jo 2:1).

João batizava em Betânia, da outra banda do Jordão (Jo 1:28). Esta Betânia deve situar-se no Jordão, não muito longe do mar da Galileia, porque em apenas dois dias Jesus já estava em Caná.

- Depois, desceu a Cafarnaum (que é a norte do mar da Galileia), onde ficou “não muitos dias” (Jo 2:12).

- E estava próxima a páscoa dos judeus, e Jesus subiu a Jerusalém (Jo 2:13).

Esta é a primeira páscoa no ministério de Jesus. 
Não sabemos quantos dias são “não muitos dias”, mas João não menciona nenhum acontecimento entre o ter descido a Cafarnaum e a subida a Jerusalém, por isso penso que foi um período breve, não tendo Jesus ainda começado a pregar. Penso que pouco mais de 50/60 dias terão decorrido desde o batismo até à primeira páscoa.

- Depois da purificação do templo, os sinais durante a festa, a conversa com Nicodemos, Jesus foi com os seus discípulos para a terra da Judeia, onde estava ali com eles e batizava (Jo 3:22).
Naquele tempo, João batizava em Enon; ainda não tinha sido lançado na prisão (Jo 3:24).

- Depois Jesus deixou a Judeia e foi outra vez para a Galileia, passando por Samaria (Jo 4:3).

Marcos 1:14 diz que Jesus foi para Galileia depois que João foi entregue à prisão.
Em Samaria Jesus disse: Não dizeis vós que ainda há quatro meses até que venha a ceifa? (Jo 4:35)
Havia várias ceifas ao ano em Israel. Mas dado que a páscoa (1º mês) fora pouco tempo antes, a colheita em causa tem que ser a da saída do ano, que era seguida da festa dos tabernáculos (Ex 23:16) no 7º mês (agosto-setembro).

- Dois dias depois partiu de Samaria e foi para a Galileia (Jo 4:43).
Jo 4:45 – Chegando à Galileia, os galileus o receberam, vistas todas as coisas que fizera em Jerusalém no dia da festa; porque também eles tinham ido à festa.

Deduzo do encadeamento de eventos que a festa a que se referem os galileus é a primeira páscoa. Agora começa verdadeiramente o ministério de Jesus na Galileia.

O primeiro ano do seu ministério, Jesus passa principalmente na Galileia, indo uma vez a Jerusalém para uma festa (Jo 5:1): - Depois disto, havia uma festa entre os judeus, e Jesus subiu a Jerusalém (Jo 5.1). Esta pode ser uma de várias festas entre a primeira páscoa e a seguinte. Páscoa é sempre indicada como a festa.

- E a páscoa, a festa dos judeus, estava próxima (Jo 6:4).

Esta é a segunda páscoa no ministério de Jesus.

Nesse período situa-se a multiplicação dos pães (Jo 6; que corresponde à segunda multiplicação de Mc 8 e Mt 15).

Nesta segunda páscoa, não há menção de Jesus ter ido a Jerusalém. Ele está na região de Tiberíade (Jo 6:23), junto ao mar da Galileia (também conhecido como o lago de Tiberíade). Ele faz o discurso do pão da vida na sinagoga de Cafarnaum (Jo 6:22-59), cujo conteúdo está referenciado ao tempo que os israelitas saíram do Egipto, celebraram a primeira páscoa e receberam o maná. Um discurso que parece adequado à época.

A partir de então muitos discípulos tornam para trás (Jo 6:66).
Pedro crê e reconhece que Jesus é o Cristo (Jo 6:67-69) e Jesus anuncia pela primeira vez a sua paixão (Lc 9:22; Mc8:31-33).– A partir dessa época Jesus começou a mostrar ser necessário ir a Jerusalém (Mt 16:21).

- Depois disto, Jesus andava pela Galileia, e já não queria andar pela Judeia, pois os judeus procuravam matá-lo (Jo 7:1).

Marcos 8:27 situa a confissão de Pedro quando estavam em Cesareia de Filipe, depois de terem passado por Tiro e Sidon, Decápolis e Betsaida (Mc 7 e 8).

- 8 dias depois, tem lugar a transfiguração (Lc 9:29).

O segundo anúncio da paixão foi quando caminhavam na Galileia (Mc 9:30-32; Mt 17:22; Lc 9:44).
A certo momento, completando-se os dias para a sua assunção, Jesus manifestou o firme propósito de ir a Jerusalém (Lc 9:51). Depois, Jesus atravessava cidades e povoados, ensinando e caminhando para Jerusalém (Lc 13:22).

- E estava próxima a festa dos judeus, a dos tabernáculos (Jo 7:1-2), e Jesus subiu à festa (Jo 7:10) e ensinava no templo durante a festa (Jo 7:14; 8:2).

Passaram-se sete meses entre a páscoa no 1º mês (Abib) e a festa dos tabernáculos no 7º mês (aprox. setembro). Sete meses em que Jesus atravessava cidades e povoados, ensinando e caminhando para Jerusalém.

- Depois da festa dos tabernáculos, Jesus parece ter continuado em Jerusalém, a ensinar no templo (Jo 9), onde o encontramos na festa da dedicação, no inverno (Jo 10:22).
Esta festa foi instituída em 164 a.C. por Judas Macabeu depois que Jerusalém foi recuperada aos sírios, o templo purificado e um novo altar reconstruído, depois de profanado por Antíoco Epífanes. Trata-se da festa de Hanukkah celebrada no mês de Quisleu (dezembro).

- Procuravam prendê-lo mas ele escapou-se e retirou-se para além do Jordão, para o lugar onde João tinha primeiramente batizado, e ali ficou. (Jo 10:39-40).

Depois temos a ressurreição de Lázaro (Jo 11:1-45) e o conselho dos principais dos sacerdotes e fariseus para o matar (Jo 11:46-53). Por isso Jesus retirou-se para uma cidade chamada Efraim junto do deserto (Jo 11: 54).

- E estava próxima a páscoa dos judeus (Jo 11:55) …

Esta é a terceira e última páscoa do ministério de Jesus, quando foi crucificado.

Baseado nestes elementos do evangelho de João, podemos deduzir que o ministério de Jesus teve uma duração de pouco mais de 2 anos, com o batismo cerca de dois meses antes da primeira páscoa, e a crucificação na terceira páscoa.

A leitura que faço é demasiado simples ou simplista? Há outros elementos que apoiam isto e que podem confirmar os dois anos de ministério?
Porque há teorias que sugerem 3 anos e meio, ou 5 anos, se o relato de João parece tão simples de interpretar?

O problema do calendário calculado.

Há vários autores que têm calculado astronomicamente as datas para aquele período. Muito utilizados são os cálculos de J.K. Fotheringham (1934) e de Parker & Dubberstein (1956), e às quais Finegan (§ 616) atribui um elevado grau de probabilidade.
Estão em causa os anos 30 a 34.

É quase consensual que a crucificação teve lugar numa sexta-feira (na mensagem anterior O SÁBADO DA RESSURREIÇÃO, julho 2017, eu defendo uma quinta-feira). 

Segundo os cálculos de Fotheringham, nos anos 30 e 33, o dia 14 de Nisan calha numa sexta-feira. Por isso, se Jesus começou o seu ministério em 29 ou 30 (a primeira páscoa), 30 dá 1 ano, e 33 dá 3 anos e uns meses para o ministério de Jesus.

Por isso alega-se geralmente que o relato de João não é completo e que omitiu uma ou mais páscoas. Mas pergunto, porque João teria tido o cuidado de distinguir cada uma destas festas se ele não tivesse uma boa razão?



O ano do início e do fim do ministério de Jesus

Em minha leitura, e tomando por certo as 3 páscoas mencionadas em João, Jesus começou o seu ministério no ano 29 (ver mensagem O ANO QUINZE DE TIBÉRIO, julho 2017). Portanto, a sua terceira páscoa seria no ano 31. Mas os cálculos astronómicos de Fotheringham e de Parker & Dubberstein, e também de Newton, não corroboram isto. No ano 31, Nisan 14 seria uma terça-feira, ou uma quarta-feira no caso de ter havido um mês intercalar. Ainda segundo Parker & Dubberstein, supondo que tivesse havido um mês intercalar, Nisan 14 seria uma quinta-feira, apenas no ano 34, o que daria um ministério de 5 anos.

Há, contudo, uma ressalva a fazer ao uso destes cálculos astronómicos. Roger Beckwith [i] chama a atenção para o cuidado a ter no uso de calendários e astronomia para determinar a cronologia da Paixão.

Fotheringham e Schoch chegaram a uma fórmula baseada em considerações astronómicas e de calendário para estabelecer os dias de Nisan 14 e 15 para os anos 27 a 34. Como tem sido assumido que a crucificação ocorreu numa 6ª feira, apenas os anos 30 e 33 entraram em consideração.

Mas na Judeia daquele tempo, a astronomia não era estudada, e o ano era regulado não por cálculo (baseado no equinócio) mas por observação.

Os judeus só começaram a calcular a data da Páscoa astronomicamente, ou com o ciclo de 19 anos, nos séculos 4 a 7 depois de Cristo. Muito mais tarde. Fontes de literatura rabínica dizem-nos que os meses e as festas não eram fixados por cálculo com antecedência mas por observação contínua. O início de cada mês era anunciado quando a lua nova era vista na Judeia. Também a adição de um 13º mês dependia da observação – a observação de sinais de primavera. Se os sinais não tinham aparecido, um 13º mês era acrescentado. Os fatores considerados eram o aparecimento do primeiro grão na cevada, o estado de crescimento das rolas e dos cordeiros (se ainda eram tenros e pequenos demais, não podiam ser usadas no sacrifício). Se o primeiro grão aparecia cedo, havia apenas 12 meses, mas se se aguardava o aparecimento do primeiro grão, devia acrescentar-se um 13º mês. Estas mesmas fórmulas ainda se aplicavam um século depois da destruição do templo.

Se o ano novo dos judeus era governado por observação e não por cálculo, isto implica um elevado grau de irregularidade e isto afeta a datação da crucificação de Jesus.

Se a decisão de acrescentar um 13º mês era tomada sem atenção ao equinócio, era inevitável que, em épocas quando os sinais de primavera chegavam cedo, o novo ano era anunciado sem esperar pela aproximação do equinócio. Portanto, se a Páscoa calhasse com frequência antes do equinócio da primavera, isto abre novas possibilidades para as datas da crucificação de Jesus.

Como não estava a ser usado um calendário calculado, é impossível sabermos quando um 13º mês era intercalado. Nem o NT nem Josefo fornecem esta informação. E há também a questão da duração do 13º mês, bem como a do 12º, antes de o calendário ser regulado astronomicamente, se 30 ou 29 dias.

Relativamente aos cálculos de Humphreys and Waddington [ii], Beckwith observa relativamente ao ano 31 --- Este é o ano favorecido por Jeremias [iii]… que defende que, naquele ano, Nisan 14 podia ter sido uma quinta-feira se fosse precedida de um 13º mês e se o anúncio da lua nova de Nisan fosse adiada por falta de visibilidade. Mas mesmo em caso de boa visibilidade, se o 13º mês tinha uma duração fixa de 30 dias, adiar 30 dias seria em si mudar Nisan 14 de terça-feira 27 de março para quinta-feira 26 de abril (Beckwith, pp. 197-198).

Relativamente ao equinócio, acontece o mesmo. Se a Páscoa calhasse antes do equinócio no ano 33, Nisan 14 seria uma quinta-feira; e se a Páscoa fosse adiada por um 13º mês em 31 ou 35, Nisan 14 seria uma quinta-feira.

Assim, visto que temos que ter cuidado com a aplicação sem mais nem menos dos cálculos astronómicos, sempre é possível que o ministério de Jesus tinha apenas dois anos, como o dá a entender o evangelho de João, quando olhamos para o que está escrito literalmente.



[i] Roger T. Beckwith, Cautionary Notes on the Use of Calendars and Astronomy to Determine the Chronology of the Passion. In: Jerry Vardaman, et al. Chronos, Kairos, Christos: Nativity and Chronological Studies presented to John Finegan (1989).

[ii] Humphreys and Waddington, The date of the crucifixion, JASA 37 (March 1985): 2-10. http://www.asa3.org/ASA/PSCF/1985/JASA3-85Humphreys.html

[iii] Joachim Jeremias, The Eucharistic Words of Jesus (1935), é uma obra de referência para os estudos sobre a última Ceia.

22/07/2017

O SÁBADO DA RESSURREIÇÃO

Em que dia da semana Jesus ressuscitou?
Este é mais um problema cronológico que tem ocupado muitas mentes.
Existem várias teorias relativamente aos dias da crucificação e ressurreição de Jesus Cristo. A mais geralmente aceite é que Jesus foi crucificado numa sexta-feira e ressuscitou no primeiro dia da semana, ou seja no dia a que chamamos domingo. Outros defendem uma crucificação na quinta-feira, ou até na quarta-feira. Raramente o domingo é posto em causa. Mas há também quem afirme que Jesus ressuscitou num sábado.
Somos chamados a analisar as Escrituras, e examinei cuidadosamente esta questão (At 17:11) e exponho a seguir a conclusão a que cheguei, e que de certo modo me surpreendeu.
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Antes de procurar estabelecer a cronologia da semana da paixão, precisamos entender claramente como funciona o calendário bíblico, os dias, os sábados e as outras festas que Deus instituiu através de Moisés. Atenção, não podemos confundir o calendário judaico atual com o calendário bíblico, nem confiar nele, porque o calendário judaico, matematicamente calculado, só atingiu a sua forma a partir do século IX d.C. e está inserido numa tradição rabínica que rejeita Jesus Cristo como o Messias. Sem esta compreensão, não sairemos da confusão.

O que precisamos ter em consideração:
1)      Contrariamente ao que nos foi sempre dito, o dia não começa e termina com o pôr-do-sol, mas o dia bíblico começa e termina com o nascer do sol. Primeiro o dia, depois a noite.[i]
2)      No entanto, a celebração do sábado (sabbath) começava à tarde, ou seja ao pôr-do-sol do dia antes do sábado até ao pôr-do-sol do dia seguinte. Lev 23:32 – Sábado de descanso vos será, então afligireis as vossas almas; … de uma tarde a outra tarde, celebrareis o vosso sábado.
Portanto, a celebração do sábado está por assim dizer “a cavalo” entre dois dias, entre o dia de sexta-feira e o dia de sábado propriamente dito.
A parte do dia de sexta-feira que antecede o pôr-do-sol é chamada “preparação” ou parasceve em Grego no Novo Testamento (Lc 23:54; Jo 19:31,42).
3)      Sabbath vem de um verbo que significa “repousar”, ”cessar”. E não se aplica apenas ao sétimo dia da semana.
É preciso distinguir entre 2 tipos de sábado (sabbath).
- Há o sábado normal, que é o 7º dia de uma semana. Lv 23:3 – Seis dias obra se fará, mas o sétimo dia será o sábado do descanso, santa convocação; nenhuma obra fareis; sábado do Senhor é em todas as vossas habitações.
- E há sábados chamados “grandes” (João 19:31) ou “solenidades” convocadas no seu tempo determinado (Lv 23:4-44), que são festas ou “sábados” anuais, quando também há “santa convocação”, descanso, e que não se pode fazer nenhuma obra servil, do mesmo modo como num sábado normal.
O primeiro e o sétimo dia da Festa dos Pães Asmos são “sábados” (Lv 23:7-8). O dia 1 de Tishri, Dia das Trombetas, é um “sábado” (Lv 23:24). O dia 10 de Tishri (7º mês), que é o Dia da Expiação, é um “sábado de descanso” (Lv 23:27-32; 16:29-31). O primeiro e o último dia da Festa dos Tabernáculos são “sábados”, solenidades, santas convocações (Lv 23:39).
4)      As festas que, nesta matéria, precisamos de entender muito bem é a Páscoa e a Festa dos Pães Asmos, que formam um conjunto indivisível. As passagens que falam das festas encontram-se nos seguintes capítulos: Êxodo 12, Levítico 23, Números 28, Deuteronómio 16.
O esquema a seguir facilita a compreensão:

Esquema atualizado em 17-08-2017
Abib 14
Abib 15
Abib 16
Abib 17
Abib 18
Abib 19
Abib 20
Abib 21
Dia
Noite















1º dia dos asmos
2º dia
3º dia
4º dia
5º dia
6º dia
7º dia
Ex 12:18

Sacrifício do cordeiro à tarde
Páscoa
Lv 23:6
Festa dos asmos
O molho das primícias é movido






Sábado de festa
=solenidade










Sábado de festa
=solenidade


No dia Abib 14, o cordeiro era sacrificado à tarde (EREB) e era comido à noite (LAYIL) com pães asmos (Ex 12:6-8). Naquela noite foi a morte dos primogénitos e a partida apressada dos Israelitas do Egipto (Dt 16:1-3).
Lv 23: 5 – No mês primeiro, aos 14 do mês, pela tarde, é a páscoa do Senhor.
Dt 16:6 - … sacrificarás a páscoa, à tarde, ao pôr-do-sol, ao tempo determinado da tua saída do Egipto
Dt 16:7 – Então a cozerás, e comerás … depois, sairás pela manhã, e irás às tuas tendas.
Ex 12.15 – 7 dias comereis pães asmos; ao primeiro dia tirareis o fermento das vossas casas
Ex 12:18 – No primeiro mês, aos 14 dias do mês, à tarde, comereis pães asmos, até 21 do mês, à tarde.
Lv 23:6 – E aos 15 deste mês [Abib], é a festa dos asmos do Senhor; sete dias comereis asmos.
Dt 16:3 – Sete dias comerás pães asmos.

Dt 16:8 – Seis dias comerás pães asmos e, no sétimo dia é solenidade ao Senhor, teu Deus: nenhuma obra farás.
Ex 12:16 – E ao primeiro dia haverá santa convocação; também ao 7º dia, tereis santa convocação: nenhuma obra se fará neles.
Lv 23:7 – No primeiro dia, tereis santa convocação, nenhuma obra servil fareis
Lv 23:8 – Ao sétimo dia, haverá santa convocação
O primeiro e o sétimo dia da Festa, quando há santas convocações, são “sábados de festa”, não são sábados semanais normais.
Visto que Abib 14 não calha no mesmo dia da semana todos os anos, há necessariamente algures entre o primeiro e o último sábado de festa dos Asmos um sábado semanal normal. Em certos anos, os sábados normais poderão coincidir com os sábados de festa.
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Depois de compreender isto, algumas passagens no NT parecem contraditórias. Quando é que Jesus e os discípulos comeram a sua ceia? No dia 14 de Abib? Porque Marcos (14:12), Lucas (22:7) e Mateus (26:17) falam no “primeiro dia dos pães asmos”, “em que importava sacrificar a páscoa”? Ou no dia anterior 13 de Abib? João 13:1 fala do “dia antes da Páscoa”. Se comeram a ceia no dia 14, Jesus seria crucificado no dia 15, no sábado da festa, o que a lei não permitiu, nem está de acordo com os evangelhos (Mt 27:62; Mc 15:42; Lc 23:54; Jo 19:31, 42) que referem todos que o dia em que Jesus foi crucificado era o “dia de preparação”, portanto a parte do dia que antecedia o pôr-do-sol da festa da Páscoa. Afinal, em que dia Jesus foi crucificado? E quantos dias depois ressuscitou? Em que dia da semana?
Em vez de me debruçar sobre as contradições, decidi analisar todo o contexto temporal, ou seja estabelecer a cronologia de todos os eventos na semana em que Jesus foi crucificado e ressuscitou, começando com a sua entrada em Jerusalém. Isto ajudou a tornar tudo muito mais claro.

Cronologia de eventos
Abib 8
Jo 12:1-19 – Foi, pois, Jesus seis dias antes da páscoa, a Betânia, onde estava Lázaro que falecera … Fizeram-lhe uma ceia … Maria ungiu os pés de Jesus …
João estabeleceu o início – 6 dias antes da páscoa – (Contámos assim: Páscoa é Abib 14, Abib 13 é 1 dia antes, Abib 12 é 2 dias antes, etc.) e a ligação com a entrada de Jesus em Jerusalém no dia seguinte (Jo 12:12). De resto, João dá poucos pormenores dos acontecimentos; passa diretamente do dia da entrada triunfal para a ceia. Lucas e Mateus não são muito explícitos na cronologia dos acontecimentos dos dias seguintes até ao dia da ceia. Mas o evangelho de Marcos, começando com a entrada triunfal de Jesus em Jerusalém, descreve dia a dia, com pormenor e cuidadosamente, a sequência de todos os acontecimentos, de todas as idas e vindas de Jesus.

Abib 9
Jo 12:12 – No dia seguinte, ouvindo uma grande multidão, que viera à festa, que Jesus vinha a Jerusalém, tomaram ramos de palmeira ….
Mt 21:12 e Lc 19:45-47 situam aqui o episódio da purificação do templo.
Mc 11:11 – E Jesus entrou em Jerusalém, no templo, e, tendo visto tudo em redor, como fosse já tarde, saiu para Betânia com os doze.

Abib 10
Mc 11:12-14 – E, no dia seguinte, quando saíram de Betânia, teve fome … vendo ao longe uma figueira …
Mc 11:15 – E vieram a Jerusalém; e Jesus, entrando no templo, começou a expulsar os que vendiam e compravam no templo …
Mc 11:19 – E sendo já tarde, saiu para fora da cidade.

Abib11
Mc 11:20 – E eles, passando pela manhã, viram que a figueira se tinha secado …
Mc 11:27 – E tornaram a Jerusalém, e andando ele pelo templo … (Jesus ensina no templo)
Mc 12:13 – E saindo ele do templo … (sermão profético)

Abib 12
Mc 14:1 – E dali a dois dias era a páscoa, e a festa dos pães asmos, e os principais dos sacerdotes e os escribas buscavam como o prenderiam com dolo, e o matariam. Mas eles diziam: Não na festa, para que, porventura, se não faça alvoroço entre o povo.
Mc 14:3 – E estando ele em Betânia, assentado à mesa em casa de Simão … (Marcos coloca aqui o episódio da unção de Jesus por Maria, com algumas diferenças do evangelho de João. Mas isto não é relevante na sequência; o que é relevante aqui é o que diz Mc 14:1 – daqui a dois dias é Páscoa. Faltava só um dia para a Páscoa.

Abib 13
Mc 14:12 – E, no primeiro dia dos pães asmos, quando sacrificavam a páscoa, disseram-lhe os discípulos: Aonde queres que vamos fazer os preparativos para comer a páscoa?
Aqui, como Mt 26:17 e Lc 22:7, parecem indicar que o dia da ceia de Jesus com os discípulos era o dia 14, o dia em que se sacrificava e comia a páscoa (ver esquema acima).
Mas, se a ceia de Jesus com os discípulos acontece no dia 14, a narrativa de Marcos omite um dia, o dia 13. E é estranho que Marcos tivesse omitido um dia, porque desde o dia da entrada triunfal em Jerusalém, Marcos relata cuidadosamente todas as idas e vindas de Jesus e alguma ocorrência em todos os dias.
João, por outro lado, parece indicar que a ceia foi anterior à festa da Páscoa, portanto no dia 13. Jo 13:1-2 – Ora, antes da festa da páscoa,…. E, acabada a ceia … (segue a narrativa da ceia e os ensinamentos daquela noite).
Além disso, a narrativa do dia da crucificação diz claramente que aquele dia era a “preparação”, parasceve do sábado, do grande sábado, isto é do sábado da festa da páscoa (Jo 19:14, 31). E ainda, o sacrifício do cordeiro em Abib 14 segundo Exodo 12 não prefigura Jesus como o Cordeiro que morreu pelos nossos pecados? Não é natural que o sacrifício de Jesus tenha acontecido nesse dia?
Por isso, deduzo que a ceia de Jesus e os discípulos foi uma ceia de páscoa antecipada ou uma ceia de despedida de Jesus dos seus discípulos.
Depois da ceia, nessa mesma noite, Jesus sai com os seus discípulos para o Monte das Oliveiras (Mt 26:30; Mc 14:26; Lc 22:39), para um lugar chamado Getsémani (Mt 26:36; Mc. 14:32).
Nessa noite Jesus é preso e levado à casa do sumo-sacerdote (Mt 26:57; Mc 14:53; Lc 22:54).
O canto do galo anuncia o amanhecer (Mc14:72; 15:1), quer se trate de um galo verdadeiro, quer de um grito de um oficial no templo que chamava a madrugada para o início do serviço no templo.

Abib 14
Ao amanhecer Jesus é levado a Pilatos (Mt 27:1; Mc 15.1).
Jo 19:14 – E era a preparação da páscoa
Jesus é crucificado à hora terceira (Mc 15:25), cerca das 9 da manhã. Da hora sexta à hora nona, houve trevas (Mt 27:45; Mc15:33). À hora nona, Jesus entrega o espírito. Era por volta das 3 horas da tarde.
João usa outro sistema de contar as horas que os evangelhos sinópticos, mas isto não interfere aqui na cronologia.
Jo 19:31 – Os judeus, pois, para que no sábado não ficassem os corpos na cruz, visto que era a preparação (pois era grande o dia de sábado), rogaram a Pilatos que se lhe quebrassem as pernas.
Mc 15:42 – E, chegada a tarde, porquanto era o dia da preparação, isto é, a véspera do sábado. Chegou José de Arimateia.
Jesus foi sepultado antes do escurecer, no dia 15 de Abib, antes de começar a celebração do “sábado da festa”. O sepulcro não estava muito longe, por causa da preparação dos judeus (Jo 19:42).
Lc 23:54-56 - e era o dia da preparação, e começava o sábado. E as mulheres, que tinham vindo com ele da Galileia, seguiram, também, e viram o sepulcro, e como foi posto o seu corpo. E, voltando elas, prepararam especiarias e unguentos;
Lc 23:56 – e no sábado repousaram, conforme o mandamento.
Repousaram, do pôr-do-sol do dia 15 ao pôr-do-sol do dia 16.
Este sábado que começava ao pôr-do-sol do dia 15 de Abib era, repito, o sábado da festa dos Pães Asmos, não o sábado semanal.

Abib 15
Mc 16:1 – E, passado o sábado, Maria Madalena, e Maria, mãe de Tiago, e Salomé, compraram aromas para irem ungi-lo.
Isto terá sido provavelmente na noite desse dia, depois do pôr-do-sol, quando já não vigoravam as restrições do sábado. As mulheres não foram certamente ao túmulo para ungir o corpo porque entretanto já era noite, e preparavam-se para o fazer na madrugada do dia seguinte.

Abib 16
Mt 28:1 – E, no fim do sábado, quando já despontava o primeiro dia da semana, Maria Madalena e a outra Maria foram ver o sepulcro.
Mt 28:1, Mc 16:1; Lc 24:1 e Jo 20:1 dizem todos que Maria Madalena foram ao sepulcro no primeiro dia da semana, de manhã cedo de madrugada, ao nascer do sol. Diziam: “quem nos revolverá a pedra da porta do sepulcro?” (Mc 16:3) Mas o túmulo já estava aberto.
Se Jesus tivesse ficado mais uma noite no túmulo, as mulheres teriam tido um dia inteiro para tratar o corpo com os aromas e as especiarias. Mas não tiveram oportunidade. Quando foram lá, o corpo de Jesus já não estava.
Por isso penso que foi naquele dia, logo antes da madrugada, que Jesus ressuscitou.

Mas depois temos uma dificuldade com a comparação com Jonas em Mt 12:40 – Como Jonas esteve 3 dias e 3 noites no ventre da baleia, assim estará o Filho do homem 3 dias e 3 noites no seio da terra.
Ressuscitando na madrugada de 16, Jesus esteve apenas 2 noites no túmulo.
Mas daqui a pouco já voltamos a esta questão.

O primeiro dos sábados
Que dia da semana era em que Jesus ressuscitou?
Tendo-se sempre considerado o sábado da festa como um sábado normal, deduziu-se sempre que Jesus ressuscitou na madrugada do dia de domingo, o primeiro dia da semana. Seria uma explicação válida se este sábado anual de festa coincidisse com um sábado semanal.
Só que, não é isto que diz a versão grega original destes versículos. Vou colocar o termo grego em substituição da palavra em português.
Mt 28:1 – E, no fim do SABBATON, quando já despontava o primeiro SABBATON, Maria Madalena e a outra Maria foram ver o sepulcro.
Mc 16:1-2 – E, passado o SABBATON, Maria … compraram aromas para irem ungi-lo. E, no primeiro SABBATON, foram ao sepulcro, de manhã cedo, ao nascer do sol.
Lc 24.1 – E, no primeiro SABBATON, muito de madrugada, foram elas ao sepulcro. E acharam a pedra revolvida…
Jo 20:1 – E no primeiro SABBATON, Maria Madalena foi ao sepulcro, de madrugada, sendo ainda escuro, e viu a pedra tirada do sepulcro.
Jo 20:19 – Chegada, pois, a tarde daquele dia, o primeiro SABBATON, e cerradas as portas onde os discípulos, com medo dos judeus, se tinham ajuntado, chegou Jesus …
Em todos estes versículos, a palavra no Grego SABBATON (do hebraico SABBATH) é traduzida por DIA DA SEMANA.
A palavra SABBATON ocorre mais de 60 vezes no Novo Testamento, e em todos os casos EXCETO aqui (e At 20:7, 1Cor 16:2 e Lc 18:12, mas que não comprometem esta interpretação), é traduzida SÁBADO, e tem sempre referência a um dia de Sábado (SABBATH).
Porquê logo aqui SABBATON é traduzido “dia da semana” e não “Sábado”?
A tradução literal do Grego nestes versículos é “o primeiro dos Sábados” (Young’s Literal Translation: Mt 28:1 - And on the eve of the sabbaths, at the dawn, toward the first of the sabbaths, came Mary the Magdalene, and the other Mary, to see the sepulcher.)
O que é o primeiro dos sábados?
Lv 23:10 – Quando houverdes entrado na terra que vos hei-de dar, e segardes a sua sega, então trareis um molho das primícias da vossa sega ao sacerdote. 11 – Ele moverá o molho perante o Senhor, para que sejais aceitos; ao seguinte dia do sábado o moverá o sacerdote. 15 – Depois para vós contareis desde o dia seguinte ao sábado, desde o dia em que trouxerdes o molho da oferta movida; sete sábados (a nossa tradução diz “semanas inteiras”) serão.
Explicando: O molho era movido no dia 16 de Abib, no dia a seguir ao sábado anual da festa da Páscoa. Depois, sete sábados (que correspondem a 7 semanas) eram contados e no dia seguinte ao 7º sábado, o 50º dia era a Festa das Semanas, Pentecostes. Para contar estes 7 sábados, começava-se a partir do “primeiro sábado”, não o sábado da festa, mas o primeiro sábado semanal depois do mover do molho de primícias.
Mt 28:1 – E, no fim do SABBATON, quando já despontava o primeiro SABATTON,…
Este versículo diz que o Sábado, o da festa da Páscoa, já tinha passado, e outro Sábado estava a amanhecer (o dia começa ao nascer do sol). Este novo dia era, agora sim, um Sábado semanal normal. Este dia de sábado normal começava ao nascer do sol do dia 16.
Portanto, Abib 16 era um sábado, iniciando-se o dia ao nascer do sol.
Jesus ressuscitou no limiar de um novo dia, que era um sábado, e não um domingo.
E o que reforça esta data é que, na madrugada desse dia, o sacerdote movia o molho das primícias. E que diz 1Cor 15:20?– Cristo ressuscitou dos mortos, e foi feito as primícias dos que dormem.

O sábado semanal anterior
Se Abib 16 era um sábado, o sábado semanal anterior seria Abib 9. Conseguimos provar que Abib 9 era um sábado?
Abib 9 foi o dia em que Jesus entrou triunfalmente em Jerusalém. Haveria dia melhor que um Sábado para Jesus mostrar que Ele era “Senhor do Sábado”?
Jesus previu que alguém iria perguntar aos discípulos porque soltavam o jumentinho (Lc 19.33; Mt21:3). Um jumento era um animal de carga, e também os animais tinham direito ao descanso no sábado (Ex 23.12; Dt 5:12-15).
Depois, no mesmo dia, Jesus foi ao templo onde expulsou os vendedores (Mt 21:12; Lc 19:45-47). Apenas Marcos situa o episódio do templo no dia seguinte.
O que fez Jesus no templo? Expulsou os que vendiam e compravam no templo. Coisas que eram proibidas ao sábado. Mc 11:16 - E não consentia que alguém levasse algum vaso pelo templo. Frase estranha, que parece não ter muito sentido no contexto, a não ser que se refira à proibição de transportar cargas pesadas no sábado. Outra coisa proibida no sábado.
Uma situação semelhante encontramos descrita em Neemias 13:15-22 relativamente ao Sábado.

Ao terceiro dia
Mas como interpretar a comparação com Jonas em Mt 12:40? – Como Jonas esteve 3 dias e 3 noites no ventre da baleia, assim estará o Filho do homem 3 dias e 3 noites no seio da terra.
Jesus falou várias vezes do seu sofrimento futuro (Mt 16:21; 17:22-23; 20:18-19; Mc 8:31; 9:31; 10:34; Lc 9:22; 24:21,46).
Mt 16:21 – Começou Jesus a mostrar aos seus discípulos, que convinha ir a Jerusalém, e padecer muito dos anciãos, e dos principais sacerdotes, e dos escribas, e ser morto, e ressuscitar ao terceiro dia.
Mt 20: 18-19 – Eis que vamos para Jerusalém, e o Filho do homem será entregue aos príncipes dos sacerdotes, e aos escribas, e condená-lo-ão à morte. E o entregarão aos gentios, para que dele escarneçam, e o açoitem e crucifiquem, e ao terceiro dia ressuscitará.
Não está aqui que Jesus ficasse sepultado na morte durante 3 dias e 3 noites, mas que a sua ressurreição seria no 3º dia de toda esta sequência de sofrimentos – ser entregue aos sacerdotes, aos gentios (Pilatos), ser condenado e escarnecido e crucificado, e morto. Isto começou na noite do dia 13 de Abib depois da ceia com a sua prisão e interrogação na casa do sumo-sacerdote de noite; no dia 14 de Abib perante Pilatos e a crucificação e sepultamento; esteve sepultado a noite de 14 e todo o sábado 15 de Abib, e ressuscitou na madrugada de 16 de Abib, ao nascer do sol (Mc 16:1), sendo ainda escuro (Jo 20:1). Foram 3 dias de calendário: 13, 14 e 15. Ao terceiro dia ressuscitou.
Quando olhamos para o esquema da Páscoa e Festa dos Pães Asmos, 16 de Abib, a madrugada do dia que Jesus ressuscitou, é o 3º dia. 14 de Abib foi o 1º dia, o dia da crucificação o 2º.
No próprio dia da ressurreição (Lc 24:13), os discípulos que iam a Emaús diziam - Lc 24:7 – sobre tudo isso, é hoje o terceiro dia desde que essas coisas aconteceram. Se esse dia era o 3º dia, Abib 15 era o 2º dia, e Abib 14 o 1º dia, e Abib 13 o dia em que tudo começou.

Abib 8
9
10
11
12
13
14
15
16
dia


















Ceia em Betânia
Entrada triunfal








Ceia
Preparação (parasceve)
Páscoa


Molho das primícias



Expulsão dos vendedores no templo








Jesus preso
Jesus perante Pilatos
Jesus crucificado
Sábado da festa
Repouso

3º dia festa pães asmos

















túmulo vazio


SÁBADO
domingo
2ª feira
SÁBADO

Contrariamente à tradição, penso poder concluir que Abib 16 – em cuja madrugada Jesus ressuscitou - não era um Domingo. Era na realidade o despontar de um Sábado. Era o “primeiro sábado” que iniciava a contagem de sete sábados para a Festa de Pentecostes. E era o dia em que o sacerdote movia o molho das primícias perante o Senhor.