13/12/2016

O DIA DE PENTECOSTES

Onde desceu o Espírito no dia de Pentecostes?

Na mensagem anterior concluímos que o grandioso templo da visão de Ezequiel é a representação espiritual do templo do período da Restauração de Israel, que é o período que vai do regresso a Jerusalém do povo judeu que estava no exílio na Babilónia até à primeira vinda de Cristo.

O templo material que foi construído no tempo de Zorobabel não consegue expressar a realidade espiritual desse período. Observámos que não há menção de que a glória do Senhor encheu o templo, como foi no caso do tabernáculo (Ex 40:34) e do templo de Salomão (2Cr 5:14) quando estes foram inaugurados. No entanto, apesar disso, Ageu profetizou «Ainda uma vez, dentro em pouco, farei abalar o céu, a terra, o mar e a terra seca; farei abalar todas as nações, e as coisas preciosas de todas as nações virão, e encherei de glória esta casa, diz o Senhor dos Exércitos. Minha é a prata, meu é o ouro, ... A glória desta última casa será maior do que a da primeira… e neste lugar darei a paz (Ageu 2:6-9)».

O que quererá isto dizer?

Certamente que a presença física de Jesus no templo durante o seu ministério é um sinal desta maior glória.

Mas ainda mais, penso que foi no dia de Pentecostes, quando o Espírito desceu sobre os discípulos, que a glória do Senhor finalmente encheu o templo de Zorobabel.

Onde estavam os discípulos naquele dia de Pentecostes? É costume aceitar como um facto que os discípulos estavam reunidos “no cenáculo”, entendendo-se com isto o lugar onde residiam quando estavam em Jerusalém, supostamente um andar superior de uma casa, talvez o mesmo lugar onde tomaram a ceia … (Mc 14:15; Lc 22:12).

Depois de terem visto Jesus ascender ao céu no monte chamado Olival, voltaram para Jerusalém, e quando ali entraram, subiram para um cenáculo (o texto Grego usa o artigo neutro). Neste local reuniam-se os apóstolos (Pedro, João, Tiago e André, etc.), com as mulheres, estando entre elas Maria, mãe de Jesus e seus irmãos (At 1:13-14). Este “cenáculo” era o seu local de alojamento? A palavra grega HYPEROION, traduzida “cenáculo”, aparece apenas 4 vezes no Novo Testamento: At 1:13; 9:37,39; 20:8. E é diferente da palavra usada para o cenáculo onde tomaram a ceia (Mc 14:15; Lc 22:12).

Em que lugar é que os irmãos se reuniam em Jerusalém, em obediência à ordem de Jesus, esperando pela “Promessa do Pai (At 1:4)?

Em Atos 1:15-26, lemos da reunião de um grupo composto de umas 120 pessoas. Não é mencionado o lugar. Temos pouca razão para crer que havia espaço para 120 pessoas se reunirem na casa onde estavam alojados os discípulos. E há ainda menos razão para supor que na manhã de um grande dia de Festa, os discípulos estivessem fechados nesse lugar.

Havia, de facto, apenas um lugar na cidade de Jerusalém onde os judeus devotos, de qualquer seita, teriam congregado naquela manhã. E havia apenas um lugar onde os eventos relatados em Atos 2 podem ter tido lugar. Este lugar é o Templo. E é desde o templo que se iniciou a proclamação das boas novas para todo o mundo. E isto estava prefigurado na visão das “águas vivas” a sair do templo (Ez 43).

«Eis que saiam águas debaixo do limiar do templo para o oriente …. Estas águas saem para a região oriental, e descem à campina, e entram no mar Morto, cujas águas ficarão saudáveis … (Ez 47:1-12).
De modo como a pregação do arrependimento para remissão de pecados a todas as nações devia começar em Jerusalém (Lc 24:47), onde Jesus determinou que esperassem a promessa do Pai (At 1:4), era também oportuno que a primeira manifestação do Espírito Santo tivesse lugar no templo; que o começo da construção da casa espiritual fosse no mesmo sítio que a casa material.

Que indicações temos no texto bíblico para podermos deduzir isto?

Lucas regista a ordem do Senhor aos discípulos para permanecerem na cidade de Jerusalém “até que do alto sejais revestidos de poder” (Lc 24:49). Jesus não indica nenhum lugar particular; mas a continuação do texto (vs. 52-53) fornece esta informação porque lemos que ”estavam sempre no templo, louvando a Deus (Lc 24:53).

Esta passagem declara que o Templo era o lugar onde se reuniam com o objetivo de esperar pela promessa; e além disso declara que estavam lá sempre, continuamente. Isto não deixa dúvidas de que nos dez dias seguintes estariam congregados no Templo e não em qualquer outro lugar na cidade.

O templo era um espaço enorme. Segundo Edersheim, a área do Templo era capaz de conter 210.000 pessoas. Ele menciona também que as colunadas no Pórtico de Salomão formavam lugares de congregação para as várias seitas, escolas e congregações de pessoas. Não ensinava Jesus no templo?

Depois do relato da assembleia das 120 pessoas (At 1:15-26), segue a narrativa do dia de Pentecostes (At 2). Este dia de festa do calendário judaico seria mais uma razão para todos estarem reunidos no Templo. E era no Templo, onde estavam assentados, que veio um som como de um vento impetuoso, que encheu toda a casa onde estavam sentados. O vento que encheu toda casa faz lembrar como no tabernáculo e no Templo a glória (então em forma de nuvem) do Senhor enchia o templo.

O ruido que veio do céu devia ouvir-se em toda a cidade, e é evidente que os judeus devotos se dirigissem ao Templo.

Naquele dia estava uma grande multidão de pessoas em Jerusalém, e certamente no Templo, o centro das festividades e rituais. É natural que também os discípulos lá estivessem. O que se entende é que os discípulos não estavam dispersos entre a multidão, mas estavam juntos no mesmo lugar, presumivelmente no Pórtico de Salomão. E a multidão afluiu para onde estavam os discípulos (At 2:5-6).

Pedro se levantou e falou, e no fim, acrescentaram-se a eles 3000 pessoas (At 2:41). Isto mostra que este evento não poderia acontecer noutro lugar a não ser no Templo. O Templo era o único lugar público em Jerusalém onde era possível juntar tantas pessoas.

Quando lemos atentamente a narrativa v.1-14, os eventos narrados aconteceram todos no mesmo local. Não houve mudança de local. O lugar onde os discípulos ficaram cheios do Espírito Santo e falaram em outras línguas era o mesmo lugar para onde as multidões afluíam e ouviam Pedro dirigir-se-lhes.

Depois do dia de Pentecostes, continuaram a prática de se reunirem diariamente no Templo, perseverando nas orações (At 2:42; 2:46; 3.1). Também partiam pão de casa em casa, mas o lugar de congregação era no Templo. Costumavam todos reunir-se, de comum acordo, no pórtico de Salomão (At 5:12). Quando os apóstolos foram presos e um anjo os libertou da prisão, este os mandou apresentar-se no Templo para falar ao povo todas as palavras desta vida. E voltaram a entrar no Templo e ensinaram (At 5:21).

Cumpriu-se o dia de Pentecostes (At 2:1). Não um qualquer dia de Pentecostes em algum qualquer ano, mas o dia em que a Festa teve o seu cumprimento histórico.

Concordo com Philip Mauro quando ele conclui que a Casa material de Deus serviu de madre para a Casa espiritual, a Igreja. E que só pode ter sido no Templo que desceu o Espírito sobre os discípulos no dia de Pentecostes.

Bibliografia

Philip Mauro, The hope of Israel (1922)

01/12/2016

O TEMPLO DE EZEQUIEL 40-48

No 25º ano do exílio do povo judeu na Babilónia, 14 anos depois de ter caído a cidade de Jerusalém, Ezequiel teve a visão de um grandioso templo.

Que templo é este? O que representa este templo da visão de Ezequiel?

É um templo futuro?

Muitos interpretam este templo como um templo futuro, de um futuro relativamente ao nosso tempo, um templo que ainda há-de ser construído.

Contudo, se olharmos simplesmente para o que nos é ensinado no Novo Testamento, podemos afirmar que isto não pode de modo algum ser uma interpretação correta.

Repetidamente é feito referência a sacrifícios animais (Ez 40:39-43; 43:18, etc.), a ofertas de manjares (Ez 42:13), ao serviço levítico (Ez 44), ao sacerdócio da linhagem de Zadoque (Ez 40:46; 43:19; 44:15). A Nova Aliança, com o seu melhor sacrifício, melhor sacerdócio e melhores promessas, tornou tudo isto obsoleto quando Jesus veio (Hb 9:1-15). Foi o próprio Jesus que aboliu o sistema antigo, que era apenas temporário, uma sombra das coisas que haviam de vir.

No templo da visão, os gentios (incircuncisos) ainda são excluídos do santuário (Ez 44:9). Mas, pelo sangue de Jesus, os gentios já não estão separados da comunidade de Israel. De ambos os povos fez um, e ambos temos acesso ao Pai (Ef 2:11-18).

Por que razão haverá de existir um templo futuro que regressa ao passado? Se acontecer, não será certamente da vontade de Deus. Seria renegar a obra de Jesus na cruz e a sua ressurreição.
Já nem há qualquer razão para continuar a existir um templo de pedra, porque a habitação de Deus passou a ser no interior do homem. Não há mais necessidade de um altar para oferecer sacrifícios: Jesus fez o derradeiro e perfeito sacrifício na cruz. E também já não há necessidade de uma cidade terrena onde estivesse o nome e o trono do Senhor, porque Deus se adora em espírito e em verdade, e porque a igreja é a luz do mundo, a cidade edificada sobre o monte.
Se o templo descrito nos capítulos 40 a 48 do livro do profeta Ezequiel não é um templo futuro, vamos refletir sobre o que poderá significar.

O contexto histórico e cronológico

Olhemos para a história bíblica e a cronologia dos factos.

Israel estava no exílio na Babilónia quando Ezequiel teve esta visão. Embora longo, o exílio seria temporário. Havia numerosas promessas de regresso à terra de Israel (Jeremias 3:14-18; 16:9-5; 23:-8; 24:5-7; 29:10-14; 30:1-4,18-20; 31; Ezequiel 11:16-20; 34:13; 36; 37).

Cronologicamente, e pela natural lógica da história, o templo que Ezequiel viu era o modelo do templo para o período que viria a seguir, com o regresso de Israel à sua terra. O profeta devia anunciar e mostrar à casa de Israel o que estava vendo, fazer-lhes saber a planta da casa e o seu arranjo, as suas saídas, entradas, todas as suas formas, todos os seus estatutos dispositivos e leis, “para que observem todas as suas instituições e estatutos e os cumpram” (Ez 40:4; 43:10-).

Deus sempre deu ao seu povo o modelo do santuário que haviam de edificar para ele pôr o seu nome. Moisés, o profeta, recebeu os planos do tabernáculo (Ex 25:8-9). David, o rei, recebeu os planos do templo (1Cr 28:11-19) que seria depois construído pelo seu filho Salomão. Ezequiel, o “filho do homem”, recebeu o modelo do templo da Restauração, que é o período que começa com o regresso do povo à terra de Israel e culmina com a vinda do Renovo, de Jesus homem (Jr 23:5). E João, o discípulo amado exilado na ilha de Patmos, recebeu a visão da Nova Jerusalém, a cidade santa, o tabernáculo de Deus com os homens (Ap 21-22:5), representação e imagem simbólica da realidade e culminar do período presente da Nova Aliança.

A visão espiritual e a realidade material

A medida em que a visão de Ezequiel havia de se cumprir no reino do natural, foi cumprida depois do regresso do cativeiro.

Porém, o templo reconstruído por Zorobabel não correspondia à magnitude do templo da visão de Ezequiel. Nem chegava a igualar a grandeza do templo de Salomão (Ag 2:3). Por isso, é geralmente interpretado como sendo outro templo, futuro.

Era impraticável concretizar materialmente o templo da visão de Ezequiel. De certo modo, porque era um período conturbado, com uma dura oposição dos adversários aos planos de reconstrução da cidade e do templo. Também, o templo visionário era de tal maneira colossal que seria difícil concretizá-lo em qualquer época. Podemos deduzir que exprime uma realidade espiritual, muito mais do que uma realidade material.

Não há informações relativamente à planta do templo que foi construído por Zorobabel, mas parece-me que as medidas terão sido as indicadas por Ciro. Terá Deus mostrado um modelo a Ciro? Não nos esqueçamos que a época em que os Judeus viviam naquele tempo era o que podemos designar como o “tempo dos gentios”, período que começou quando Deus deu o reino a Nabucodonosor: Tu, ó rei, rei de reis, a quem o Deus do céu conferiu o reino, o poder, a força e a glória (Dn 2:37). Nabucodonosor era cabeça do primeiro reino e Ciro, do segundo: O Senhor, Deus dos céus, me deu todos os reinos da terra (2Cr 36:23).

Ciro afirmou que Deus o encarregou de lhe edificar uma casa em Jerusalém (2Cr 36:23). No decreto que ele baixou no seu primeiro ano, diz com respeito à casa de Deus em Jerusalém que “seus fundamentos serão firmes, a sua altura de 60 côvados, e a sua largura de 60 côvados, com três carreiras de grandes pedras, e uma de madeira nova (Ed 6:3).

Materialmente, o templo era mais pequeno, menos rico e vistoso mas, por outro lado, a época da Restauração era um tempo com uma realidade espiritual muito mais rica, e cronologicamente mais avançada no plano da salvação. Eram os “últimos dias” antes da manifestação do Messias, dias de restauração para Israel.

Observei também uma diferença com as anteriores casas. Quando Moisés levantou o tabernáculo, no primeiro dia do primeiro mês, a nuvem cobriu a tenda da congregação e a glória (KABOD) do Senhor encheu o tabernáculo (Ex 40:34). De igual modo, quando a arca foi introduzido no templo de Salomão acabado de construir, no 7º mês (2Cr 5:3), a glória do Senhor encheu a casa de Deus (2Cr 5:14). Estranhamente, não há relato disto quando foi dedicado o templo de Zorobabel (Ed 6:16), apesar de, em Ageu, Deus declarar a sua presença no meio do povo (Ag 1:13; 2:5). Mas no templo da visão de Ezequiel, neste sim, a glória do Senhor enchia a casa do Senhor (Ez 43:4-5; 44:4).

Aos olhos do povo, a casa era como coisa de nada em comparação com o glorioso templo de Salomão (Ag 2:3). Contudo, Deus disse “Encherei de glória esta casa” e “a glória desta última casa será maior do que a da primeira” (Ag 2:7, 9).

Será que este “encher de glória” foi realizado quando Jesus esteve e ensinava no templo? Porque o templo que estava em Jerusalém no tempo de Jesus era aquele que fora construído por Zorobabel, incrementado e enriquecido muito mais tarde pelo rei Herodes e cuja planta inicial ficou irreconhecível, mas era o templo de Zorobabel.

Ou será que foi no dia de Pentecostes que a glória do Senhor encheu o templo?


Analisaremos esta hipótese na próxima mensagem.