24/09/2015

O DECRETO DE CIRO (2)


A questão cronológica da profecia das 70 semanas de Daniel


A profecia das 70 semanas de Daniel constitui um quebra-cabeça cronológico, cuja razão principal deriva disto:


o número de anos entre o decreto de Ciro, que constitui o ponto de partida lógico e natural do período de 70 semanas (490 anos), e que é tradicionalmente datado 536 a.C. e o batismo de Jesus, no ano 30 d.C. aproximadamente, que constitui o término da 69ª semana (483 anos), ultrapassa largamente a duração da profecia (cerca de 83 anos).


Isto teve por consequência a procura de soluções, que passam por alternativas ao decreto de Ciro como ponto de partida das 70 semanas, ou por intercalar “lapsos” indeterminados de tempo entre o primeiro grupo de 7 semanas e o segundo grupo de 62 semanas e/ou entre o fim do grupo de 62 semanas e a 70ª semana.


Muitos daqueles que consideram que as 70 semanas devem ser interpretadas à letra rejeitam, por isso, o decreto de Ciro como ordem de saída, e procuram substituir este por outro decreto alternativo alguns anos mais tarde na história.


Em nosso ver, a interpretação bíblica não deixa margem para duvidar de que o decreto de Ciro constitui efetivamente a “ordem de saída” para a reconstrução de Jerusalém e, portanto, o ponto onde se iniciam os 490 anos da profecia. Apresentaremos argumentos contra aqueles decretos alternativos.


 


Mas, se tomarmos por correta a data de 536 a.C. para o decreto de Ciro, ficamos com um problema por resolver. As 70 semanas representam uma indicação de tempo com conotações meramente simbólicas? Então porquê uma profecia com um tempo muito específico? Teremos de intercalar lapsos de tempo? Mas como justificar estes lapsos de tempo?


Por outro lado, se tomarmos por incorreta a data de 536 a.C. para o decreto de Ciro, toda a história deveria ser revista. Vários autores (Donovan Courville, Immanuel Velikovsky, David Rohl, Peter James, Emmet Sweeney, e outros) já fizeram propostas revisionistas, mas não têm tido aceitação no meio académico (ver artigo de John Crowe, The revision of Ancient history: a perspective, in:  http://www.sis-group.org.uk/ancient.htm


 


Deixaremos para mais tarde esta reflexão. A nossa abordagem, até agora, nestes estudos, tem sido a de construir uma cronologia começando do início da história do homem, e utilizando apenas informação bíblica para estabelecer datas. Não temos, salvo em alguns casos para termos de comparação, usado datas “a.C.” (obtidas retroativa e posteriormente) para esta cronologia. Por enquanto, continuaremos nesta base. Porque é nesta base que Daniel e o povo judeu terão feito os seus cálculos quanto à data expectada para a vinda do Messias.


O primeiro ano de Ciro era o ano (aproximadamente) 3468 Anno Hominis, o ano da saída da ordem para restaurar e edificar Jerusalém.


Sabe, e entende: desde a saída da ordem para restaurar e para edificar Jerusalém, até ao Ungido, ao Príncipe, sete semanas e sessenta e duas semanas: as praças e as circunvalações se reedificarão, mas em tempos angustiosos (Dn 9:25).


Tudo no texto bíblico indica que o ponto de partida das setenta semanas – a saída da ordem para restaurar e para edificar Jerusalém (v.25) – não pode ser outro que o decreto de Ciro autorizando os judeus a regressarem à sua terra e reconstruírem o seu templo.


Este decreto constitui o ponto de transição entre o fim do domínio babilónico e a libertação do cativeiro e, simultaneamente, o começo de um novo período na existência nacional de Israel, já não como nação soberana e independente, embora na sua própria terra, mas como um povo unido pela sua religião debaixo da governação de um rei gentio.


O decreto de Ciro foi o decreto que veio em cumprimento das profecias de Jeremias. “Logo que se cumprirem para Babilónia setenta anos atentarei para vós”, escreveu Jeremias de Jerusalém aos exilados na Babilónia (Jr 29:10). Isto significava que quando chegasse o fim do domínio babilónico, terminaria o cativeiro dos judeus e o povo poderia voltar para casa (Jr 25:8-12). Foi um decreto de liberdade.


Também 2 Crónicas 36:21-23 estabelece claramente esta transição:


… para que se cumprisse a palavra do SENHOR, pela boca de Jeremias, até que a terra se agradasse dos seus sábados; todos os dias da desolação repousou, até que os setenta anos se cumpriram.


Porém, no primeiro ano de Ciro, rei da Pérsia (para que se cumprisse a palavra do SENHOR, pela boca de Jeremias), despertou o SENHOR o espírito de Ciro, rei da Pérsia, o qual fez passar pregão por todo o seu reino, como também por escrito, dizendo: Assim diz Ciro, rei da Pérsia: O SENHOR, Deus dos céus, me deu todos os reinos da terra e me encarregou de lhe edificar uma casa em Jerusalém, que está em Judá; quem, dentre vós é de todo o seu povo, que suba, e o SENHOR, seu Deus, seja com ele.”


O livro de Esdras, que continua a narração histórica de 2 Crónicas, abre com o decreto de Ciro. É este decreto que desencadeou a grande viragem na história do povo judeu após o cativeiro na Babilónia, e que inicia o tempo da restauração de Israel. Os livros de Esdras e Neemias relatam o regresso a Jerusalém e a reedificação do templo, da cidade e dos muros no meio de feroz oposição.


Contra aqueles que afirmam que Ciro apenas deu ordem para reconstruir o templo e não a cidade, um argumento fundamental, que reforça a tese de que o decreto de Ciro foi efetivamente a ordem de saída para restaurar e edificar Jerusalém, é uma profecia de Isaías, que fora dada duzentos anos antes pelo profeta Isaías, e que menciona Ciro (Koresh em Hebraico) pelo seu nome (Is 44:21 – 45:17). Deus fala:

[Eu sou o Senhor] que confirma a palavra do meu servo e cumpro o conselho dos meus mensageiros; que digo de Jerusalém: ela será habitada; e das cidades de Judá: elas serão edificadas; e levantarei as suas ruínas; que digo à profundeza das águas: Seca-te, e eu secarei os teus rios;

que digo de Ciro: ele é meu pastor e cumprirá tudo o que me apraz; que digo também de Jerusalém: Será edificada; e do templo: Será fundado (Is 44:26-28). 

Assim diz o Senhor ao seu ungido, a Ciro, a quem tomo pela mão direita, para abater as nações ante a sua face […] eu irei adiante de ti […] Por amor do meu servo Jacob, e de Israel, meu escolhido, eu te chamei pelo teu nome, e te pus o sobre nome, ainda que não me conheces (Is 44:1-4)

Deus falou diretamente a Ciro, a quem chama o seu “ungido” (Is 45:1). Esdras 1:2 relata o que Ciro disse de si próprio: Assim diz Ciro, rei da Pérsia: o SENHOR, Deus dos céus, me deu todos os reinos da terra; e Ele me encarregou de lhe edificar uma casa em Jerusalém. E ainda em Isaías 45:13, Deus diz de Ciro: Eu o despertei em justiça e todos os seus caminhos endireitarei, ele edificará a minha cidade e soltará os meus cativos não por preço nem por presentes. Ciro, como o “ungido” do Senhor, prefigura Jesus, o Messias. O Messias é aquele que salva e liberta o seu povo, edifica o seu templo, a sua Igreja (Mt 16:18), e a sua cidade celestial.

Babilónia, na qualidade de cabeça da estátua dos impérios gentios no sonho de Nabucodonosor (Dn 2), é representativa de todos os impérios seguintes. Por isso, a libertação do cativeiro da Babilónia prefigura a libertação definitiva por Cristo. Ciro, o libertador, é figura de Cristo, em que ele liberta o povo do cativeiro, edifica Jerusalém e o templo (Is 44:48) e inaugura uma nova era na história de Israel. Porque Babilónia é representativa dos que guardam Israel cativo, a libertação e restauração é frequentemente falada em termos de libertação do cativeiro da Babilónia. Por exemplo, o capítulo 40 de Isaías, que anuncia consolo para o povo de Deus e a “voz que clama no deserto”, que Mateus 3:2-3 aplica a João Baptista, está diretamente relacionado ao cativeiro da Babilónia. No trecho imediatamente anterior (Is 39:5-8), Isaías dissera ao rei Ezequias que Israel seria levado para Babilónia.

É evidente que Ciro não agiu por si próprio. Deus despertou o seu espírito; Deus está no controlo de todas as coisas (Dn 11:1). É a palavra de Deus que dá a ordem. O termo que é traduzido como “ordem” é, literalmente, “palavra” (DABHAR).

É isso que o anjo Gabriel viera anunciar a Daniel: no princípio das tuas súplicas, saiu a ordem (DABHAR) e eu vim para to declarar, porque és mui amado. O anjo viera anunciar que a libertação estava próxima. A ordem (palavra) da saída do povo já fora dada por Deus em resposta à oração de Daniel.

É nossa opinião que as Escrituras não deixam lugar a quaisquer dúvidas quanto ao decreto de Ciro como ponto de partida das 70 semanas. Ainda mais porque, contra a oposição que se levantara à construção, os judeus sempre se defenderam recorrendo à permissão dada por Ciro no seu primeiro ano (Ed 3:7; 4:3; 5:13-17). Assim também a autorização de Dario, no segundo ano do seu reinado, de retomarem as obras fundamenta-se no decreto de Ciro (Ed 6:1-3).


As praças e as circunvalações se reedificarão em tempos angustiosos


A seguir à ordem de Ciro, uma parte do povo judeu voltou à sua terra. Sob a direção de Zorobabel e Jeshua iniciaram as obras de reedificação do templo, da cidade e dos muros, quando se levantou oposição e a obra cessou. Embora os adversários conseguissem fazer parar a obra durante vários anos, esta foi retomada e terminada com sucesso.

Sete semanas, isto são 49 anos, seriam necessárias para reedificar a cidade, as praças e circunvalações, em tempos angustiosos. Os livros de Esdras e Neemias, e dos profetas Ageu e Zacarias, dão conta dos tempos difíceis da reconstrução da cidade, do templo e dos muros. À luz de Daniel 9:25, os acontecimentos descritos nestes livros decorreram dentro dos limites das primeiras 7 semanas da profecia.

As praças, ou ruas, encontram-se dentro da cidade; fazem parte dela. As circunvalações, por vezes traduzido tranqueiras, fosso ou muros, referem-se ao sistema de fortificações em redor da cidade. A Septuaginta usa a palavra grega τειχος, que significa muro, muralha. Trata-se obviamente dos muros da cidade, cuja reconstrução foi conduzida por Neemias. Tanto a reconstrução do templo, que sofreu forte oposição e mesmo interrupção durante vários anos, como a restauração dos muros, que foi levada a cabo com as armas na mão, decorreram em tempos angustiosos. A finalização da obra, a aliança que foi assinada (Ne 9:38; 10) e a festa de dedicação dos muros (Ne 12:27-43) representam o fim das primeiras sete semanas. Numa próxima mensagem, trataremos pormenorizadamente da cronologia destas 7 semanas, ou 49 anos.


Alternativas ao decreto de Ciro


À luz do texto bíblico, é natural concluir que a ordem de saída para edificar Jerusalém é o decreto de Ciro, e que a cidade e os muros foram, de seguida, reedificados em 49 anos (isto é, nas primeiras 7 das 70 semanas).

Mas o desfasamento cronológico de 80 anos já referido, não obstante as manifestas provas bíblicas a favor do decreto de Ciro, parecem colocar obstáculos a esta interpretação, conduzindo a que se procurassem soluções alternativas para funcionar como “ordem de saída”.

Para facilitar a compreensão, juntamos a seguinte lista dos reis persas que interessam ao nosso estudo e as datas da cronologia consensual:

Ciro                       reinou                 (538 a 530)          9 anos
Cambises                                           529 a 522)          8 anos
(Entre Cambises e Dario I, Smerdis/Gaumata usurpou o poder até que Dario o conseguiu derrotar em 522. Reinou apenas 7 meses.)
Dario I Histaspes                             (521 a 486)          36 anos
Xerxes                                               (485 a 465)          21 anos
Artaxerxes I Longimano                (464 a 424)          41 anos


Os livros de Esdras e Neemias referem vários documentos oficiais, posteriores ao de Ciro, que estão todos, de alguma maneira, relacionados com a reedificação de Jerusalém e/ou do templo. Entraram em consideração os seguintes:

1. O decreto de Dario Hystaspes no segundo ano do seu reinado.

Desde o tempo de Ciro começaram as tentativas das gentes locais para parar a construção (Ed 4:5). A oposição levou à interrupção das obras durante vários anos, até que no segundo ano de Dario, o profeta Ageu incitou o povo a retomar o trabalho. Quando recomeçaram a edificar, Tatenai, o governador daquém do Eufrates, foi logo inquirir quem os autorizou a reedificar a casa e restaurar o muro, e escreveu a avisar Dario. Dario mandou procurar nos arquivos, onde se encontrou o decreto de Ciro. Nesta sequência, Dario, no segundo ano do seu reinado, autorizou o recomeço das obras do templo. A história está contada em Esdras 4-6 e Ageu 1.

2. O decreto de Artaxerxes, alegadamente Artaxerxes I Longimano, no sétimo ano do seu reinado.

Passadas a construção e dedicação do templo no sexto ano de Dario, Esdras, o escriba, subiu a Jerusalém com uma carta do rei Artaxerxes (Ed 7:11-26), autorizando que ele fosse a Jerusalém, juntamente com quem quisesse do povo de Israel, para levar prata e ouro oferecido pelo rei, e ofertas do povo para a casa de Deus, para comprar com esse dinheiro animais para o sacrifício, para recolocar no templo os utensílios e para nomear magistrados e juízes. Conclui Esdras assim: Bendito seja o Senhor Deus de nossos pais, que deste modo moveu o coração do rei para ornar a casa do Senhor, a qual este em Jerusalém (Ed 7:27-28).

3. O decreto de Artaxerxes, alegadamente Artaxerxes I Longimano, no vigésimo ano do seu reinado.

Depois de tomar conhecimento que em Jerusalém os muros ainda estavam derribados e suas portas queimadas a fogo, Neemias solicita ao rei autorização para ir a Jerusalém com a missão de reconstruir os muros. Esta autorização é-lhe dada mediante cartas dirigidas pelo rei aos governadores dalém do Eufrates e a Asafe, guarda das matas do rei, para fornecerem aos judeus madeira para as vigas das portas da cidadela do templo, para os muros da cidade, e para a casa em que deverei [Neemias] alojar-me (Ne 2:8). Estas últimas cartas são uma autorização específica para a reconstrução dos muros da cidade, que estavam ainda derribados e com as portas queimadas, e para o fornecimento dos respetivos materiais necessários (Neemias 1 e 2).

Este último “decreto” é pela maioria aceite e defendido como “ordem de saída”, isto porque em termos cronológicos é o que se enquadra melhor no tempo literal da profecia de Daniel e tendo em conta as datas da cronologia consensual.

Em primeiro lugar, podemos rejeitar todas estas “ordens de saída” alternativas, mesmo à luz da cronologia consensual. Mau grado todos os cálculos e tentativas, nenhum destes alegados decretos se enquadra exatamente nos 490 anos. Os primeiros dois são demasiado próximos de Ciro, tendo também anos a menos e o último é demasiado tarde, ultrapassando o tempo do batismo de Jesus, que é o término da 69ª semana (ver mensagens sobre a profecia das 70 semanas de Daniel). Existem cálculos que utilizam um subterfúgio: uma medida de tempo a que chamam de “ano profético” e que teria uma duração de apenas 360 dias[1]. Deste modo "acertam" no tempo, contudo, o uso de um “ano profético” não tem fundamentos bíblicos. Não nos adianta aqui debater a validade do “ano profético”, porque há outros argumentos bíblicos através dos quais podemos rejeitar todos estes alegados decretos, inclusive o do vigésimo ano de Artaxerxes I Longimano.


Argumentos contra os decretos alternativos


O mais óbvio argumento contra qualquer das alternativas avançadas é ser por demais estranho que a “ordem de saída para restaurar e edificar Jerusalém” tivesse sido dada quando Jerusalém, o templo e os muros já estavam a ser edificados.

No ano do seu regresso à terra, no sétimo mês (que é Tishri, setembro/outubro), edificaram o altar, estando já os filhos de Israel nas cidades (Ed 3:1-6), e celebraram a festa dos tabernáculos. Mas ainda não estavam postos os fundamentos do templo do Senhor (v.6). Naquele mesmo ano, deram dinheiro aos pedreiros e aos carpinteiros, e comida e azeite aos sidónios e tírios, para trazerem do Líbano madeira de cedro ao mar, para Jope, segundo a permissão que lhes tinha dado Ciro, rei da Pérsia (Ed 3:7). A madeira de cedro serviria para a construção do templo certamente, e a permissão fora dada por Ciro.

No segundo ano da sua vinda à casa de Deus em Jerusalém, diz Esdras 3:8, começou a obra da casa do Senhor.

A obra de reconstrução e restauração começou, portanto, logo após o regresso. Já foi referido que um dos argumentos contra o decreto de Ciro e a favor do decreto de Artaxerxes é que Daniel 9:25 diz que a “ordem de saída” era para restaurar e edificar Jerusalém, não falando expressamente do templo.

Contrapomos aqui o que diz Deus através de Isaías: digo de Ciro: Ele é meu pastor, e cumprirá tudo o que me apraz; que digo também de Jerusalém: Será edificada; e do templo: Será fundado (Is 44:28).

Que é um templo sem a cidade e o povo? O templo é o lugar onde Deus habita, no meio do seu povo. O povo, ou pelo menos uma parte dele, habitava em Jerusalém (1 Cr 9:1-3). Também, antes de se iniciar a construção do templo, havia que construir casas para habitação e outras infraestruturas necessárias à vida diária. Tudo isto, juntamente com o templo, constitui a cidade. Portanto, pode dizer-se que Jerusalém começou efetivamente a ser reedificada desde o dia em que o povo regressou, a seguir à ordem de Ciro.

Isto prova a carta escrita por Reum e Sinsai (Ed 4:7-16) que dizia que os judeus estavam reedificando aquela rebelde e malvada cidade, e restaurando os seus muros, e reparando os seus fundamentos (v.12). Esta carta deu origem à proibição de continuar com a edificação da cidade (Ed 4:17-24). Cessou pois a obra até ao segundo ano do rei Dario. O rei “Artaxerxes” a quem a carta era endereçada é, portanto, um rei anterior a Dario, possivelmente Cambises (voltaremos mais adiante à questão dos nomes dos reis persas). Assim, antes de a obra do templo ser interrompida, a cidade estava a ser reedificada, bem como os muros.

No segundo ano de Dario, quando Ageu incitou o povo a retomar as obras do templo que estavam paradas, ele disse: Acaso é tempo de habitardes vós em casas apaineladas, enquanto esta casa permanece em ruínas? (Ag 1.4). Mais uma prova de que a cidade estava a ser edificada com as suas casas, embora as obras do templo estivessem paradas.

Todos os argumentos utilizados pelos judeus para refutar a oposição do inimigo à edificação fundamentam-se no decreto de Ciro: Esdras 3:7; 4:3; 5:13-14. A autorização de Dario no segundo ano do seu reinado para recomeçar as obras do templo remete peremptoriamente ao decreto de Ciro. Isto invalida totalmente a possibilidade de o decreto de Dario ser a “ordem de saída”.

Nenhum argumento pode ser trazido a favor das cartas dadas pelo rei Artaxerxes a Esdras, no 7º ano do seu reinado. Não se trata de todo de uma ordem para a reedificação de Jerusalém, nem do templo, que já estava construído e dedicado. Esdras foi para Jerusalém especificamente com a finalidade de ornar o templo com a prata e o ouro e os utensílios que levava com ele.

Cerca de 11 anos depois de Esdras ter ido para Jerusalém, é a vez de Neemias regressar a Jerusalém. A missão de Neemias, que começou no 20º ano do mesmo Artaxerxes de Esdras, era, basicamente, reconstruir os muros da cidade e colocar as portas. Os trabalhos estão descritos em pormenor em vários capítulos do livro de Neemias. O colocar das portas e a dedicação do muro mete um ponto final à obra de reconstrução de Jerusalém. Terminado o trabalho, Neemias volta a Susã no 32º ano do reinado de Artaxerxes.

A reconstrução dos muros foi apenas a última fase da restauração de Jerusalém. Esta reconstrução teria começado 92 anos depois do regresso à terra com o decreto de Ciro. Em tantos anos, a cidade já devia estar edificada e bastante desenvolvida. E ainda, dificilmente a última fase da obra de reconstrução poderá ser considerada uma “ordem de saída para restaurar e reedificar Jerusalém”.

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Além dos argumentos acima apresentados, a adoção do decreto de Artaxerxes I Longimano como ordem de saída para edificar Jerusalém tem outros defeitos.
Primeiro, distorce completamente a cronologia das 7 primeiras semanas (49 anos) da profecia que, de acordo com Daniel 9:25, era o tempo que havia de durar a reedificação da cidade e dos muros em tempos angustiosos.

De acordo com o relato de Esdras, os tempos angustiosos começaram muito cedo após o decreto de Ciro, com a oposição à reconstrução do templo (Ed 4), e duraram cerca de 17 anos até ao segundo ano de Dario, ano em que recomeçaram as obras. Também foram 12 anos de tempos angustiosos quando se restauraram os muros sob a direção de Neemias (Ne 2-6), desde o 20º até ao 32º ano em que Neemias voltou para Babilónia, tendo terminado a sua missão. E será lícito pensar que o intervalo (presumivelmente de 70 anos) entre o terminar da obra do templo e o começo do restauro dos muros também foram tempos angustiosos, de outro modo os judeus teriam certamente continuado as obras. Teríamos assim um período de cerca de 104 anos angustiosos.

Portanto, se optarmos pelo decreto de Ciro como ordem de saída e a dedicação dos muros no 32º ano de Artaxerxes I Longimano como o ponto final da restauração de Jerusalém em tempos angustiosos, ultrapassamos largamente os 49 anos preditos por Daniel.

Um outro problema é que a idade de Esdras e Neemias, que estavam entre os que vieram primeiro com Zorobabel, não permite identificar este Artaxerxes com Artaxerxes I Longimano.
Por isso, se tivermos em consideração que a reedificação da cidade, incluindo os muros (porque estes fazem parte integrante da cidade), devia ter lugar em 49 anos, vamos ter de provar que a identidade do rei Artaxerxes de Esdras e Neemias não é Artaxerxes I Longimano, como é assumido por muitos.

Será o tema da mensagem seguinte.



[1] Sir Robert Anderson, The Coming Prince [1880].

05/09/2015

A PROFECIA DAS 70 SEMANAS DE DANIEL (6) – A desolação


E o povo do príncipe, que há de vir, destruirá a cidade e o santuário, e o seu fim será como uma inundação; e até ao fim haverá guerra; estão determinadas assolações (v.26b).

Sobre a asa das abominações virá o assolador, e isso até à consumação; e o que está determinado será derramado sobre o assolador (v.27b).


O povo do príncipe destruirá a cidade


Esta passagem prediz sem sombra de dúvida o juízo de Deus sobre a cidade de Jerusalém, executado pelos exércitos romanos, no ano 70 da nossa era. Como acontecera no tempo de Nabucodonosor da Babilónia, aconteceria novamente uma grande destruição, agora muito concretamente em consequência de Israel ter rejeitado o seu Messias. Jesus veio para o que era seu, e os seus não o receberam (Jo 1:11). O próprio Jesus confirmou em várias ocasiões que o juízo viria sobre Jerusalém porque não reconheceram o tempo da sua visitação; nas suas parábolas (Mt 21: 33-46; 22:1-7; Lc 20:9-16; Is 6:8-13), no sermão profético (Mt 24), quando chorou sobre Jerusalém.

Pois sobre ti virão dias em que os teus inimigos te cercarão de trincheiras e, por todos os lados, te apertarão o cerco; e te arrasarão e aos teus filhos dentro de ti; não deixarão em ti pedra sobre pedra porque não reconheceste a oportunidade da tua visitação (Lc 19:43-44).

Israel não deu ouvidos aos servos de Deus, aos profetas, que em seu nome falavam aos reis, aos príncipes e a todo o povo da terra, como confessara Daniel (Dn 9:6). Jesus disse aos fariseus:

Sois filhos dos que mataram os profetas. Enchei vós, pois, a medida de vossos pais […] eis que eu vos envio profetas, sábios e escribas. A uns matareis e crucificareis; outros açoitareis nas vossas sinagogas e perseguireis de cidade em cidade; para que sobre vós recaia todo o sangue justo derramado sobre a terra, desde o sangue do justo Abel […] (Mt 23:31-35)

As autoridades de Israel julgaram e condenaram Jesus através de meios falsos. Não foi um processo justo. Eles foram, de facto, homicidas. Vós o matastes, crucificando-o por mãos de iníquos (At 2:23), afirmou Pedro aos judeus reunidos por ocasião da festa de Pentecostes. Na lei, o castigo do homicida era a morte (Nm 35:30-31).

O fim de Jerusalém foi num dilúvio, que nos faz lembrar o dilúvio que sobreveio ao mundo no tempo de Noé.

Foi um tempo atribulado, uma grande tribulação, antes da destruição final. Houve uma guerra sangrenta entre os judeus e os ocupantes romanos. Os exércitos romanos sitiaram a cidade durante três anos e meio. Por causa do cerco grassou uma fome terrível na cidade. E como se não bastasse, havia guerras internas, dentro da cidade, entre facções judaicas rivais, pilhagens e assassinatos entre irmãos judeus. Flávio Josefo descreve com muito realismo os horrores desta guerra.

O príncipe (aqui também NAGIYD), cujo povo havia de destruir a cidade e o santuário, é geralmente identificado com o general Tito, comandante daquelas legiões e filho do então imperador Vespasiano. Paralelamente, podemos ver naquele príncipe romano destruidor uma correspondência com o quarto animal (besta) das visões de Daniel: o animal terrível, que devorava e pisava aos pés (Dn 7:7-28), porque Roma foi o quarto império. Numa interpretação histórica, foi efetivamente o general Tito e as suas legiões que levaram a efeito a destruição de Jerusalém.

Mas, atendendo ao contexto e à simbologia bíblica, não seria mais exato dizer que este príncipe que vem com o seu povo é o mesmo príncipe que o do v.25? É, no fim de contas, Jesus que vem como Senhor dos Exércitos para executar vingança, juízo e justiça sobre os rebeldes e inimigos. É a Deus que pertence a vingança e é portanto Ele que a lidera os povos que usa como o seu instrumento: Assíria, Babilónia,  … e Roma.

… O Senhor levanta a sua voz diante do seu exército; porque muitíssimo grande é o seu arraial; porque é poderoso quem executa as suas ordens; sim, grande é o dia do Senhor e mui terrível! Quem o poderá suportar? (Joel 2:1-11)

É o próprio Deus quem destrói o seu santuário (este princípio continua válido nos tempos do Novo Testamento; ver 1 Co 3:17, se alguém destruir o santuário de Deus, Deus o destruirá), mesmo se para este efeito usa outros agentes.

Na visão de Ezequiel relativa à matança na cidade de Jerusalém (Ez 9), e no capítulo que descreve a saída da glória de Deus do templo (Ez 10), Deus falou ao homem vestido de linho para encher as mãos de brasas acesas e espalhá-las sobre a cidade. As brasas vinham de entre os querubins (Ez 10:2, 7). Esta é uma referência a Deuteronómio 13:12-16, que descreve como deviam ser julgadas as cidades idólatras. Ajuntarás todo o seu despojo no meio da sua praça, e a cidade e todo o seu despojo queimarás por oferta total ao Senhor teu Deus, e será montão perpétuo de ruínas; nunca mais se edificará (v.16). A cidade apóstata era oferecida em holocausto. O fogo utilizado para queimar ofertas e holocaustos era o fogo do altar e este fogo tinha origem em Deus. Quando o tabernáculo e o templo de Salomão foram consagrados, fogo saiu de Deus para consumir o holocausto no altar (Lv 9:24; 2 Cr 7:1). Este fogo era mantido aceso pelos sacerdotes e usado para começar outros fogos. Unicamente o fogo do altar era autorizado para acender outros fogos sacrificiais[1].

É evidente que Deus está no controlo da destruição, mas o versículo diz que é o povo do príncipe que destrói a cidade. Na interpretação histórica, o povo era o exército romano, mas na interpretação espiritual, é o povo de Deus, os santos. O Apocalipse mostra-nos este aspecto. Foram as orações dos santos, a clamar por vingança, que provocaram a destruição da cidade que se tinha tornado prostituta e que estava cheia do sangue dos santos. Até quando, ó Soberano Senhor, santo e verdadeiro, não julgas nem vingas o nosso sangue dos que habitam sobre a terra? (Ap 7:10). As orações dos santos foram oferecidas com incenso sobre o altar de ouro diante do trono, e o fumo do incenso subiu a Deus com as orações dos santos. Mas a seguir, o anjo tomou o incensário, encheu-o do fogo do altar e atirou o fogo à terra. E houve trovões, vozes, relâmpagos e terramoto (Ap 8:3-5), imagens proféticas características que ilustram o derramar do juízo do Senhor (por ex. Is 13:6-13; Is 29:6; Jl 2:10-11). A destruição de Jerusalém foi um dia de juízo. O fogo do altar, para destruir a cidade apóstata, vem do céu e é atirado à terra em resposta às orações dos santos[2].

A destruição de Jerusalém aconteceu no ano 70 d.C., portanto, 40 anos depois da morte de Jesus. O versículo 26 não diz que a destruição de Jerusalém devia acontecer na 70ª semana, mas depois das [sete e] sessenta e duas semanas. O Ungido foi morto depois das (7 e) 62 semanas, e pelo v.27 sabemos que isto aconteceu no meio da 70ª semana: na metade da semana fará cessar o sacrifício e a oferta de manjares. Mas se o julgamento sobre Jerusalém não aconteceu dentro do quadro das 70 semanas, podemos, contudo, dizer que a causa e o motivo dessa destruição se encontra nos acontecimentos da última semana, mais especificamente na rejeição do Messias pelo seu próprio povo.

O castigo final fora adiado 40 anos. Novamente vemos a história bíblica repetir-se. Israel, quando saiu do Egipto e o povo recusou entrar na terra prometida depois do relatório negativo dos espias, andou 40 anos pelo deserto. Ao longo destes 40 anos, o tempo de uma geração, pereceram todos os incrédulos e a geração seguinte tomou posse da terra (Nm 32:13). Reconhece-se na época entre o ano 30 e 70 d.C. o mesmo padrão. Deus providenciou salvação e libertação para o seu povo e a promessa de uma nova terra, um novo Reino. Mas, para aqueles que recusaram, o seu fim foi destruição. E não entraram no Reino prometido.

Nesse tempo … haverá tempo de angústia, qual nunca houve, desde que houve nação até àquele tempo; mas naquele tempo será salvo o teu povo, todo aquele que for achado inscrito no livro (Dn 12:1). A desolação veio sobre a Jerusalém terrena, sobre o símbolo da Velha Aliança, dando fim definitivo àquela dispensação. Mas havia salvação para quem cresse em Jesus. Todo aquele que invocar o Senhor será salvo (At 2:21).

 


Sobre a asa das abominações virá o assolador


Sobre a asa das abominações virá o assolador, e isso até à consumação; e o que está determinado será derramado sobre o assolador.

O assolador (ou destruidor) veio sobre a asa das abominações; isto é, veio por causa das abominações. Há que definir então o que são abominações.

A palavra hebraica SHEKETS (em grego, ‘bdelygma’), geralmente traduzida “abominação”, refere-se a transgressões abomináveis e detestáveis trazidas para dentro do santuário. São atos de idolatria que profanam o santuário[3].

Abominações não são ações cometidas por estranhos à aliança, mas são cometidas na presença de Deus pelo próprio povo de Deus, representados pelos seus sacerdotes. Porque os filhos de Judá fizeram o que era mau perante mim, diz o Senhor: puseram os seus ídolos abomináveis na casa que se chama pelo meu nome, para a contaminarem (Jr 7:30). Quando estava no exílio, Ezequiel viu em visão as abominações cometidas no santuário pelos sacerdotes (Ez 8) e viu a glória do Senhor sair do templo por causa da presença daquelas abominações (Ez 9:3; 10:18). Foram as abominações cometidas no templo pelos sacerdotes de Israel que contaminaram o lugar santo e resultaram na primeira destruição de Jerusalém e do templo de Salomão por Nabucodonosor (Jr 4:1;7:30; 13:27; Ez 5:9,11;6:11; 8:1-18; 2 Cr 36:14-17).

Não era a presença dos exércitos de Nabucodonosor no templo que constituía abominação, mas o facto desta presença e ação do inimigo era a consequência visível da abominação cometida por Israel. A abominação trouxe juízo, executado mediante o exército de um povo estranho. Daniel tinha plena consciência disto como podemos ver na sua oração.

Assim também na segunda destruição de Jerusalém (no ano 70 d.C.), o assolador viria por causa das abominações. Nos evangelhos, Jesus inspecionou duas vezes o templo e expulsou os vendilhões, uma primeira vez no princípio do seu ministério (Jo 2:13-17) e a segunda no final (Mt 21:12-13), acusando os judeus de terem feito dele um covil de salteadores. Pouco depois Jesus disse aos fariseus: a vossa casa vos ficará deserta (Mt 23:28). Momentos depois, Jesus saiu do templo (Mt 24:1), à semelhança da glória do Senhor que Ezequiel viu sair do templo, para nunca mais lá voltar, deixando-o deserto e “desolado”.

É um facto que os judeus continuaram a oferecer sacrifícios no templo enquanto este ficou de pé (até ao ano 70) mas, legalmente, a obra de Cristo na cruz aboliu o sistema sacrificial, fazendo com que a oferta de qualquer tipo de sacrifícios deixasse de fazer sentido para sempre. Rasgou-se o véu do templo e abriu-se o acesso ao santo dos santos, pelo sangue de Jesus (Hb 10:19).

A continuação dos sacrifícios e das ofertas significava a rejeição do Senhor e do seu Messias e era, por conseguinte, idolatria (estabelecimento da sua própria religião e justiça). Idolatria é abominação.

A expressão sobre a asa das abominações está relacionada com Números 15:37-41: Fala aos filhos de Israel, e dize-lhes que nas bordas (literalmente: asas) das suas vestes façam franjas pelas suas gerações … serão para que, vendo-as, vos lembreis de todos os mandamentos do Senhor, e os façais. Eram asas de santidade para lembrar os israelitas de guardarem a lei. Através de Ageu, Deus mandou perguntar aos sacerdotes: Se alguém leva carne santa na aba (asa) da sua veste e com a sua aba tocar no pão, ou no guisado, ou no vinho, ou no azeite, ou em qualquer outro mantimento, ficará este santificado? … Não … Se alguém, que se tinha tornado impuro pelo contacto com um corpo morto, tocar nalguma destas coisas, ficará isso imundo? … Ficará imunda. Então, respondeu Ageu e disse: Assim é este povo, e assim é esta nação diante do meu rosto, disse o Senhor; e assim é toda a obra das suas mãos; e tudo o que ali oferecem imundo é (Ag 2:11-14). Em vez ser de asas de santidade, asas de abominação traziam destruição.

Assolações estavam determinadas (v.26), e isto até à consumação (v.27). A consumação de quê? De todos os vestígios físicos relacionados com a aliança da lei, a qual estava simbolicamente representada pelo templo e a cidade (terrena) de Jerusalém, onde Deus fez habitar o seu nome. Com a Nova Aliança Deus mudou a sua habitação para outro lugar, já não a Jerusalém terrena, mas a Jerusalém celestial, o templo espiritual, a Igreja (Jo 14:23; 1 Co 3:16; Ap 21:2-3). É como Jesus disse à mulher samaritana: a hora vem, quando nem neste monte, nem em Jerusalém adorareis o Paimas os verdadeiros adoradores adoram-no em espírito e em verdade (Jo 4:20-24). A Velha Aliança tornou-se obsoleta, deixou de ter utilidade e o que restava dela devia ser destruído. Quando Ele diz Nova, torna antiquada a primeira. Ora, aquilo que se torna antiquado e envelhecido, está prestes a desaparecer (Hb 8:13), escreveu Paulo aos Hebreus um par de anos antes da destruição de Jerusalém. Não havia qualquer esperança de que aquela Jerusalém terrena continuasse a existir como lugar da habitação de Deus.

Resta identificar o assolador. Em geral, considera-se que o assolador é o “povo do príncipe” (v.26) que destruiu a cidade e sobre o qual no futuro seria derramado “o que está determinado”. Deus usava povos estranhos como instrumento para trazer os seus juízos sobre Israel, mas isto não significava que eles eram inocentados. O julgamento sobre Babilónia é disto um bom exemplo (Is 47; Jr 50-51). Se o assolador é Roma, o quarto animal, o juízo também foi derramado sobre ele.

Por outro lado, visto que foram as abominações dos sacerdotes e do povo de Israel a verdadeira causa da assolação, pode-se dizer que estes são o verdadeiro assolador. Como cabeça espiritual de Israel, o sumo-sacerdote seria o principal responsável da abominação, e sobre ele e sobre o povo seria derramado o que está determinado, e o que estava determinado era a maldição da lei (Lv 26). A última maldição (Lv 26:32-39) foi cumprida à letra no término da guerra entre judeus e romanos. No dia 10 de Av fogo foi posto ao santuário e o mês seguinte, no dia 8 de Elul, Jerusalém caiu totalmente nas mãos dos Romanos, segundo o relato de Flávio Josefo[4]. Aqueles que não foram mortos no cerco, pela fome ou pela espada, foram vendidos como escravos e dispersos por todo o mundo.




[1] A história do grupo de Coré em Números 16 é um bom exemplo do uso de fogo estranho, que não tinha origem no altar. Moisés e Arão resolveram a questão com fogo do altar (v.46).
[2] David Chilton, Days of Vengeance (1987), p.231-233.
[3] Há duas palavras hebraicas que são variavelmente traduzidas abominação ou coisa detestável: SHEKETS e TO’EBAH. TO’EBAH são atos detestáveis que ocorrem na vida diária, que estão em conflito com a lei moral e resultam em julgamento e expulsão da terra (exemplo: Lv 18:19-25). SHEQETS é usado para atos detestáveis que ocorrem no contexto do templo e que entram em conflito direto com o santuário, e que resultam em expulsão do santuário. Ver: James B. Jordan, The abomination of desolation, Part 1, 2, 3, 4a, 4b, in: Biblical Chronology, nº 25, 26, 31, 32 (1991). 

A Guerra dos Judeus, Livro VI, cap.4 a 10.
Foi editado em 2007, pelas Edições Sílabo, a primeira tradução completa em Português de A guerra dos Judeus.